Talvez, seja redundante afirmar que um aspecto
bastante presente no “Dick Tracy”, de Warren Beatty, seja a afetação: As cores
desiguais que infestam os habitantes e a cidade onde transcorrem as aventuras
do detetive reto e implacável denotam certa visão superficial que o diretor
–que também se encarrega de interpretar o protagonista –tem do material oriundo
dos quadrinhos. O mundo que ele faz questão de envolver seu filme é definido
por um visual de cores primárias, translúcidas e específicas, como um cartoon à
moda antiga, onde os cenários aparentam bidimensionalidade, e seus personagens
–a despeito do elenco famosos que dá vida a muitos deles –são construídos por
quilos de maquiagem a moldar rostos parecidos com máscaras caricaturais.
Era o ano de 1990 e, contando pouco tempo (um
ano na verdade) do imenso sucesso de bilheteria de “Batman”, de Tim Burton,
podia-se dizer que o cinema comercial não sabia ainda como realizar uma
adaptação de quadrinhos (e levaria pelo menos mais uma década para começar a
descobri-lo) baseando-se, portanto, no que parecia ter funcionado: Como a
produção de Burton, o filme de Beatty investiu pesado nos elementos visuais
(não à toa venceu os Oscars de Melhor Maquiagem e Melhor Direção de Arte, além
de Melhor Canção Original) e na campanha massiva de marketing.
O roteiro? Escrito e reescrito a seis mãos, o
enredo era oscilante e convulsivo, recheado de situações que balbuciam as incoerências
da narrativa e lhe tiram ritmo. Nele, vemos a sanha vingativa do gangster Big
Boy Caprice (Al Pacino, num esforço válido para fazer sua expressividade
transpor a pesada maquiagem) elaborar diversos planos para derrubar o detetive
Dick Tracy, seu arquiinimigo. Ele quer ver Tracy incriminado e, para tanto,
envolve em seus estratagemas uma coleção de figuras vilanescas e estranhas,
como Mumbles (Dustin Hoffman reunindo-se com Beatty depois do fiasco “Ishtar”),
Flattop (William Forsythe) e a cantora Breathless Mahoney (Madonna, namorada de
Beatty na época). A trama paralela que coloca Tracy na iminente condição de pai
de família ao adotar um garoto de rua (o pequeno Charlie Kosmo) ao lado de sua
noiva (a feiosa Glenne Headly) é tão desinteressante quanto aquela que opõe o
herói aos vilões.
A direção de Beatty parece deliberadamente
tomar como mérito o fato de negligenciar o conteúdo em prol do extraordinário
cuidado visual.
Acaba assim conduzido à um
equívoco fatal: Enaltece os valores estéticos enquanto deixa de lado toda a
qualidade da narrativa.
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