É um título e tanto quando afirmam que este vem
a ser o filme favorito de Steven Spielberg. A verdade é que sua excelência lhe
faz jus, e tal execução não poderia partir de outro senão de um mestre maior
como Akira Kurosawa.
Ele acompanha, com interesse e reflexão a
trajetória de Kenji Watanabe (Takashi Shimura, um dos habituais colaboradores
de Kurosawa, assim como Toshiro Mifune, tendo inclusive participado de “Os Sete
Samurais”), um burocrata em idade avançada, cuja vida pessoal metódica, muito
espelhada na disciplinada vida profissional, sofre um baque ao descobrir-se
vítima de câncer.
A perspectiva de uma existência enfim limitada
lhe faz perceber que a busca pela obtenção de dinheiro que lhe norteou a vida
foi, afinal, inútil: De que aquilo lhe serviu?
A tentativa de entender algum significado em
tudo toma-lhe os primeiros dias, nos quais até mesmo ensaia algumas tentativas
de rebelião –divertidas noitadas ao lado de um novo amigo que não rendem coisa
alguma exceto pequenos aborrecimentos.
A vida (ou o que dela resta) parece enfim
ganhar algum propósito quando Watanabe percebe que seus esforços finais nos
meses que lhe restam poderão ser úteis a um único objetivo: Proporcionar aos
moradores de um cortiço a construção de um parquinho de diversões em meio à
desolação da favela.
Lutar para levar um pouco de felicidade ao
coração da miséria.
Numa manobra narrativa primorosa, o mestre
Kurosawa intercede no trecho final do filme, mostrando o elogioso cortejo
fúnebre de Watanabe, já falecido: A condução do diretor não se desestabiliza
por isso; agora são as pessoas que o conheceram que relembram seus últimos
momentos, como se tentassem montar um quebra-cabeças a respeito de quem aquele
homem foi e qual o significado de suas enigmáticas ações e atitudes em seus
últimos dias de vida.
Com este drama humanista (e apesar de tudo,
otimista) amparado em seu inconfundível e magistral estilo, o mestre cria aqui
um milagre: Uma história que parte do princípio de um velho burocrata que
descobre ter câncer terminal, o quê acaba dando novo enfoque ao seu modo
(tardio) de enxergar a vida. Uma história que, por sua própria natureza, tinha
tudo para resultar depressiva, amarga, sombria até, mas que nas mãos de
Kurosawa converte-se na mais primorosa das observações acerca do sentido
prático de nossa existência, além de um ensaio eficaz e lúcido sobre a maneira
bastante imprevisível como seremos lembrados.
Sob o prisma de uma morte
eminente Kurosawa encontra uma forma de falar sobre a vida.
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