O diretor Benjamin Christensen, ainda na época
do cinema mudo, quando convenções de gênero ainda estavam em processo de serem
definidas, concebeu esta experiência sensorial que pode-se, em grande medida,
ser considerada um filme de terror, embora seja também uma hábil miscelânea de
registros fictícios com linguagem documental, o quê, para efeitos dramáticos,
contribui para sua atmosfera amedrontadora e realista, um elemento narrativo
sempre eficaz para a suspensão de crença do público –não à toa, ao lado de
tantos outros ótimos e obscuros exemplares, como “Os Demônios”, de Ken Russell,
e "Madre Joana dos Anjos”, de Jerzy Kawalerowicz, “Haxan” foi uma das
influências de William Friedkin para conceber seu seminal “O Exorcista”.
Christensen (que, no filme, se deu ao luxo de
interpretar o capeta!) monta uma narrativa episódica –são sete segmentos –que
passeia pela Idade Média, flagrando casos de possessão demoníaca, de
perseguição a supostas ‘bruxas’ e outros acontecimentos sobrenaturais,
deflagrados em sua maioria pelo corrosivo medo que o ser humano alimenta pelo
desconhecido.
Lançando mão de um elaborado trabalho de cena
–e plenamente digno de admiração, onde se percebe as grandes influências dos
pintores Hieronymus Bosch e Peter Bruegel (brilhantes estetas da condição
humana) na orientação de sua identidade visual –o diretor Cristensen pinça
seqüências viscerais envoltas em fabulosa aura de folclore, usando muitos dos
fatores narrativos a sua disposição para conduzir uma observação nem sempre
óbvia da justaposição perigosa e equivocada do misticismo com a superstição,
levando esses flagrantes eficientes de choque a integrar uma analogia que se
estabelece com os comportamentos (e as imposições) vistas na atualidade.
Construído de maneira
essencialmente subjetiva (e não raro, refletindo em sua narrativa as
inclinações ideológicas explícitas de seu diretor), “Häxan” preserva intacta a
sua capacidade de intrigar o expectador, no comentário irônico que seu registro
desigual consegue obter.
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