quinta-feira, 10 de agosto de 2017

T2 - Trainspotting

Não deixa de ser um acontecimento cinematográfico o fato de Danny Boile, passados vinte anos, entregar para o mundo uma continuação de “Trainspotting”.
Disposto a honrar e respeitar tudo o que seu trabalho significou, ele não apenas trás de volta todo o elenco original, como também uma quantidade absurda de nomes na equipe técnica, desde o produtor Andrew MacDonald até o roteirista John Hodge.
E para aqueles que temiam uma possível redundância no ato de retomar trama e personagens, eis que Boyle conseguiu realizar mais uma vez uma obra sensacional: Se ela terá o mesmo status cult e a mesma relevância do filme original ainda não dá para saber, e francamente, não importa muito diante da satisfação imensa que proporciona.
É um prazer rever todos aqueles personagens: Mark Renton (Ewan McGregor) agora vive em Amsterdã, onde se estabeleceu depois que partiu com o dinheiro roubado de seus amigos. Um mal súbito, uma crise matrimonial e uma frustração profissional o levam a regressar para a cidade de Edimburgo, na Escócia, onde viveu dias tumultuados com os amigos durante a juventude –e desde o início, há uma inteligência e um arrojo singulares na forma com que Boyle registra esse regresso impregnado de alguma nostalgia e amplo vigor narrativo.
Seus amigos seguiram rumos previsíveis: Spud (Ewen Bremmer) tenta –e paulatinamente fracassa –uma reabilitação para conviver com a ex-mulher e o filho (ela uma rápida personagem em “Trainspotting”), mas a condição de viciado na qual esteve durante as últimas décadas o tornou incapaz de funcionar em sociedade; Sick Boy que atende agora pelo seu nome, Simon (Johnny Lee Miller), herdou um bar de sua família e amarga nele a baixíssima freqüência de clientes enquanto tenta ganhar por fora chantageando alguns clientes adúlteros como a ajuda de sua bela e jovem namorada Veronika (Anjela Nedyalkova); o vingativo Begbie (Robert Carlyle), que passou as últimas duas décadas sonhando em trucidar Renton, por sua vez está num presídio, onde alimenta intenções iminentes e imediatas de fuga –e que Renton se cuide quando ele o fizer!
Boyle não se esqueceu nem mesmo de Diane, a namoradinha colegial de Renton no primeiro filme (interpretada pela bela e eficiente Kelly MacDonald), que reaparece numa divertida ponta como advogada.
Assim sendo, o regresso de Renton lhe permite reatar os laços com o hesitante Simon (que de início não descarta fazê-lo vítima de uma de suas armações), e com o decadente Spud. A justaposição do passado com o presente onde a vida lhes confronta com diferentes espécies de derrocadas acaba levando os personagens a um novo rumo, que Boyle sabe muito bem tornar saboroso de acompanhar para o expectador.
Obedecendo algumas rápidas –e para muitos expectadores imperceptíveis –rimas visuais do filme anterior, Boyle valoriza, como lhe é natural, a grande esperteza presente em sua narrativa, evidenciando o quanto evoluiu como cineasta nos últimos vinte anos, mesmo já sendo ele muito bom em 1996! O retorno aos mesmos personagens lhe permite ofertar um leque amplo de emoções ao expectador: “T2” vai da divertimento genuíno e incontido à tensão inesperada e súbita, do humor estranhamente negro –e, pelo jeito, tipicamente escocês –ao improvável drama humano.
Um belo trabalho de Danny Boyle que consegue honrar um dos mais memoráveis títulos de sua filmografia.

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