quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Colossal

Não é, de modo algum, casual o fato de que os ataques do monstro mostrado neste filme se sucedem na cidade de Seul, capital da Coréia do Sul: O filme do diretor Nacho Vigalondo é, sobre diversos aspectos, fortemente influenciado pelo cinema incomum e vigoroso praticado pelos cineastas de lá.
Herda deles, por exemplo, uma premissa insana e surreal: A nova-iorquina Gloria (Anne Hathaway, recuperando um pouco do brilho perdido nos últimos anos), devido à sua incapacidade de lidar com suas bebedeiras, foi praticamente expulsa de seu apartamento pelo namorado Tim (Dan Stevens, da série “Downton Abbey”) e agora não tem outra opção senão voltar a morar na casa onde cresceu. O reencontro com antigos amigos de juventude é inevitável; e quem ela encontra é Oscar (Jason Sudeikis, uma presença bem menos cômica do que se poderia esperar) que por ela parece nutrir um desejo ainda não resolvido e lhe oferece emprego de garçonete no bar suburbano herdado do pai –logo ela, que precisava de distância das bebidas para refazer sua vida!
Com o tempo, Gloria estabelece um círculo de amizades: Além do prestativo Oscar –que não tardará, também, a revelar um intempestivo lado negro –seus companheiros de bebedeira são o filosófico e viciado Garth (Tim Blake Nelson, de “E Aí, Meu Irmão, Cadê Você?”) e o jovem Joel (Austin Stowell).
Ah, sim, existe o detalhe essencial que acrescenta insanidade e surrealismo ao enredo: Paralelo à esse colapso em que anda sua vida surge, lá na Coréia do Sul, um monstro misterioso levando destruição e medo à população.
Tal monstro é a própria Gloria (!): Ao pisar na área de um parquinho próximo de sua casa num determinado horário (e a explicação para esse fenômeno, ainda que previsivelmente mirabolante e até redundante, vem perto de seu final), o monstro se materializa em Seul, e realiza exatamente os mesmos movimentos que ela também faz (!).
O temor dela em machucar inadvertidamente pessoas do outro lado do mundo é ampliado quando o próprio Oscar descobre que, assim como ela, também pode se materializar em Seul –por sua vez, como um robô gigante (!). A partir daí, Oscar dá vazão a todos os seus ressentimentos por Gloria demonstrar atração por Joel e não por ele, o quê compromete a segurança dos sul-coreanos, e dá a Oscar um meio de chantagear e controlar a vida de Gloria.
A saída que ela encontra para esse desenlace é até bastante inventiva e inesperada.

A tradição dos filmes de monstros do cinema comercial é antiga e ampla, envolvendo exemplares como o clássico “King Kong”, e suas várias versões e reformulações, o suspense em found-footage “Cloverfield-Monstro”, o famoso “Godzilla” –protagonista de incontáveis produções –e diversos outros títulos que passeiam por superproduções e pérolas do cinema trash. À essa vasta coleção, Vigalondo acrescenta um de seus mais desiguais espécimes: Um filme de monstro que é, também, um drama psicológico sobre as frustrações acarretadas pela falta de amadurecimento, no qual as facetas de cinema fantástico, embora inseridas com um mínimo de plausibilidade na trama, são também metáforas sobre a dinâmica abusiva nos relacionamentos desfigurados pelo rancor e pela mágoa.

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