terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

Lady MacBeth

Na tragédia “MacBeth” escrita por William Shakespeare, a personagem de Lady MacBeth ocupa um lugar de destaque: É aquela que proporciona o ponto de partida de toda a intriga que constituirá a trama diabólica pelo simples fato de que, a despeito de seu marido e protagonista, é ela quem possui a ausência de freio moral e a iniciativa para conceber um ato inominável de crueldade.
Essa personagem tão emblemática quanto determinante serviu de base para o escritor russo Nikolai Leskov escrever, em 1865, o romance “Lady MacBeth do Distrito de Mtsensk” –obra esta que o diretor William Oldroyd adapta aqui em tonalidades poderosíssimas.
Não mais ambientado na Rússia, como no livro, mas desta vez na Inglaterra –o que lhe ressalta a proximidade dramática com os estudos da condição humana realizados pelo bardo –o filme acompanha as circunstâncias opressivas da vida de Katherine (a fantástica Florence Pugh).
Vendida pela família a um marido que mal a suporta e a um sogro que a destrata a cada comentário que faz, ela parece servir, na mansão campestre onde é confinada, como adereço ao lugar, tanto quanto os móveis ou a prataria: Sua função mais aparente nos dias que se seguem ao matrimônio é passar as tardes dentro de um ostensivo vestido azul, sentada ao sofá da sala e nada mais. É comum Katherine dormir com tal enfado.
À noite nada fica melhor; o Sr. Lester (Paul Hilton), seu marido, quando não a ignora por completo se restringe a ordenar secamente que se desnude –e a mantém assim parada até dormir!
Durante uma prolongada ausência do marido e do sogro, Katherine acaba envolvendo-se com Sebastian (Cosmo Jarvis) em cujas atitudes libidinosas ela encontra o ardor que não existe em seu casamento.
É aí que a ‘Lady MacBeth’, por assim dizer, irá aflorar dentro de Katherine: Uma vez experimentada a satisfação emocional e sexual plena, não é tolerável a ela voltar à rotina aviltante de antes quando seu sogro e seu marido regressarem, e movida por essa constatação Katherine se transforma.
A empregada negra Anna (Naomi Ackie) não mais se aproveitará de uma ou outra circunstância para lhe infligir pequenas perversidades. Não mais seu sogro lhe dirá os impropérios que bem quiser. E quando então retornar, não mais seu marido será o senhor de seu destino.
Revelando um potencial para a crueldade que espanta no fogo que arde dentro de seus olhos –e que a atuação de Florence abrange com precisão assombrosa –Katherine vai gradativamente pondo em prática estratagemas mais e mais inacreditáveis a medida que a narrativa exige dela cada vez mais sangue frio para conquistar sua independência.
A personagem atinge níveis de fato impronunciáveis na sordidez que consegue perpetrar, sobretudo, na meia hora final. Isso tudo só não depõe contra sua protagonista porque o diretor Oldroyd soube dosar primorosamente a ressonância moral e o distanciamento emocional dos demais personagens, e porque Florence Pugh ofusca a todos eles com seu magnetismo e seu talento.

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