É de um notável paradoxo que a Pixar tenha
feito um filme sobre a morte e sobre o Dia de Los Muertos, no México, e que, no
entanto, pulsa de vida.
Contudo, é exatamente essa a linda ironia que
eles nos entregam: Há muitas gerações passadas, a matriarca da família de
Miguel instaurou uma espécie de tradição; nada de música ou cantoria dentro de
casa –fruto da imensa decepção que ela teve com seu grande amor, um músico que
preteriu ela e a filha em favor da carreira e desapareceu.
Muitos e muitos anos passados, a tal filha,
Inês (Coco, no original) é bisavó de Miguel, cuja família ao renegar a música
desenvolveu habilidade em sapataria.
Entretanto, Miguel tem um dom nato para cantar,
herdado certamente de seu tataravô –que ele acredita ser o idolatrado Ernesto
de La Cruz, o grande cantor mexicano.
No Dia de Los Muertos –quando as famílias
depositam oferendas às fotos de seus parentes mortos para que seus fantasmas
venham visitá-los –Miguel decide roubar o violão do mausoléu de Ernesto de La
Cruz para tocar num show de talentos. Ao primeiro dedilhar, porém, Miguel é
transportado para o Mundo dos Mortos. Lá, ele encontra seus familiares mortos,
incluindo sua rígida tataravó, e um problema: Deve obter a benção de seu tataravô
para voltar ao Mundo dos Vivos e tornar a cantar.
Mas, a verdade que morreu com alguns dos
membros de sua família é mais profunda e complexa do que Miguel pode imaginar. E,
agora, ele deve lutar para trazer essa verdade ao Mundo dos Vivos a fim de
corrigir algumas injustiças e não deixar que certas lembranças se percam para
sempre.
Diferente do oitentista “Footlose” –com o qual
a premissa guarda alguma semelhança –cujo tema serve para um musical sobre
choque de gerações e um descontraído romance que enaltece a rebeldia juvenil, “Viva-A
Vida É Uma Festa” vai muito mais além e fala sobre valores de família passados
através de gerações, sobre a importância da cultura e da memória; e nesse
sentido há nele um paralelo com o próprio cinema.
Como no recente “Divertida
Mente” ou em “Toy Story 3” (dirigido, aliás, pelo mesmo Lee Unkrich) a Pixar
cria mais um espetáculo visual que se põe à frente de tudo que fizeram antes
(grandes exemplos desse arrojo são a ponte constituída de pétalas de flor que
liga o Mundo dos Vivos e o dos Mortos, e a reluzente favela dos mortos,
riquíssima em detalhes feitos com amor), mas ainda assim o ancora numa trama
cheia de inteligência, simpatia e inquestionável poder de emocionar; a cena,
perto do final, em que Miguel canta para a bisavó a música vencedora do Oscar2018 de Melhor Canção, “Lembre de Mim” é um momento de pura emoção que acompanhará
o expectador muito tempo depois do filme ter se acabado.
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