quarta-feira, 23 de maio de 2018

Se...


O cinema inglês no fim da década de 1970 e começo da de 80 era inescapavelmente rebelde: Se por um lado ele tinha influências da Nova Hollywood que, nos EUA, dava um sabor de transgressão à algumas obras produzidas pelos próprios estúdios, por outro, a cultura inglesa, impulsionada pela acidez e pela irreverência do movimento punk se alastrava, na forma de inconformismo, para outras expressões de arte.
Realizado por Lindsay Anderson, “Se...” é um filme que reflete perfeitamente esse estado de espírito. Não há muito o quê se esperar de diferente dele quando olhamos para o seu ator principal: Malcolm McDowell lembrado pelos marcantes e audaciosos papéis em “Laranja Mecânica” e “Calígula” –colocar McDowell no papel de protagonista de um filme naquela época já era, portanto, uma declaração!
Seu personagem é Mick Travis que inicia um novo ano letivo em uma rígida escola pública para garotos. O ambiente é conservador, autoritário e rigoroso –e, no contexto, um convite à rebelião.
Claro que as manifestações de contravenção dos jovens são sufocadas de todas as maneiras; a mais contundente é a surra de varas promovida pelos alunos mais velhos durante a qual os jovens são obrigados a contar as chibatadas –a narrativa de Anderson e o modo como conduz a cena nos leva a aguardar por uma reviravolta que nunca chega, ampliando a sensação de desconforto e impotência.
Em algum momento, um certo surrealismo começa a contaminar o filme: O delírio sexual (e nada prático) do protagonista na cena de nudez com a exuberante Christine Noonan; cenas coloridas se convertem em preto & branco e, após algum tempo, voltam a serem coloridas sem maiores esclarecimentos por parte do roteiro (Anderson contou, mais tarde, que esse recurso aleatório se deve, não por estilo, mas por limitação orçamentária!); personagens que antes haviam morrido reaparecem em momentos completamente mirabolantes dando a entender que a sanidade e a seriedade foram deixadas de lado pela narrativa.
É o filme de Anderson incorporando à austeridade inabalável de sua primeira parte (onde prevalece um ritmo, uma coerência e uma compostura que reflete a rigidez acadêmica) uma dose irremediável da rebeldia de seus protagonistas –eles podem não ter saído por inteiro vitoriosos de seu embate existencial e ideológico contra as autoridades escolares, mas o filme no qual estavam sofreu uma metamorfose que o adequou à mentalidade inquieta de seus heróis revolucionários.

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