Prova evidente da importância que este clássico
de Arthur Penn conquistou para o cinema é a atitude dos membros da Academia de
Artes Cinematográficas (assim como os organizadores da cerimônia do Oscar) da
época em que foi lançado (1968), onde saiu somente com os prêmios de Melhor
Fotografia e Atriz Coadjuvante e os do ano de 2017, quando reconheceram seu
significado singular chamando seu casal protagonistas, Warren Beatty e Faye
Dunaway, para apresentar o prêmio principal –e eles acabaram envolvidos
indiretamente naquele vexame de envelopes trocados o quê levou o Oscar a
chamá-los para apresentar o mesmo prêmio no ano seguinte, mas, enfim, essa é
outra história...
Clássico como poucos filmes conseguirem a
proeza de se tornar –a ponto de ter atrelado ao seu nome um arquétipo usado até
por quem nem viu e nem conhece o filme –“Bonnie & Clyde” é tão sensacional,
divertido e comercialmente eufórico que essas qualidades populares
automaticamente fizeram alguns críticos duvidar de sua perenidade artística.
O filme de Penn acompanha com um interesse
desigual a vida algo bucólica de Bonnie Parker (a quem a belíssima Faye Dunaway
empresta uma caracterização irrepreensível), garota americana na década de 1930
tentando equilibrar-se entre a pobreza, a monotonia social e as limitações
típicas de ser uma mulher no período.
Ela flerta com o inicialmente estranho Clyde
Barrow (Warren Beatty, fantástico) e, embora no princípio ele não lhe passe a
segurança de um relacionamento duradouro, logo essas impressões são deixadas
para trás das maneiras mais inesperadas possíveis: Clyde é um foragido
assaltante de bancos (o simbolismo fálico de sua arma na primeira vez que
mostra à ela tem tudo a ver com isso). Ele vive de cidade em cidade, sempre
arriscadamente e sse sabor de aventura prometido por Clyde fascina Bonnie e ela
junta-se a ele.
A medida que o casal vai desbravando os EUA, os
outros personagens somam-se a eles: O jovem arredio e empolgado C. W. Moss
(Michael J. Pollard), o próprio irmão de Clyde, Buck (Gene Hackman) e sua
esposa Blanche (Estelle Parsons, a ganhadora do Oscar de Coadjuvante).
Eles ganham um antagonista na pele do xerife
Hammer (Denver Pyle), o quê porá um ponto final em sua vida de assaltos.
Mais do que fazer um tratado moral sobre a
criminalidade, Arthur Penn cria ao redor de seus protagonistas uma sedutora
névoa ambígua de liberdade e rebeldia. É impossível não se deixar de cativar
por esse casal protagonista que o diretor registra como párias fora do sistema
em busca de uma felicidade desigual cercados por um mundo de cidadezinhas
medíocres e estradas com campos verdejantes, ou até mesmo por amor tão puro e
fulminante –ainda que a narrativa ocasionalmente ironize uma certa insatisfação
sexual.
Ao refletir certas facetas de contestação de
uma contracultura que então nascia, o diretor Arthur Penn moldou um das
primeiras obras do cinema onde a ação adquiria importância narrativa e não como
sequências à parte do contexto.
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