Quase não existem regras (ou seria melhor dizer
clichês) que a realização de David Ayer (de “Esquadrão Suicida”) não segue
dentro dos cânones dos filmes de guerra ambientados na Segunda Guerra Mundial.
Prova mais contundente de que o estilo de Ayer
como diretor não exatamente prima pela forma sobre o conteúdo, mas pela
caracterização antes da profundidade, “Corações de Ferro” parece preocupar-se
mais com o figurino impecavelmente realista, com a direção de arte meticulosa
(em meio à qual o tanque é o exemplo mais formidável) e com todas as
caprichadas facetas técnicas e visuais do que propriamente com a coerência do
que está sendo contado.
Fury é o nome do tanque de guerra capitaneado
com mão de ferro pelo exigente e rude Sargento ‘Wardaddy’ Colliers (Brad Pitt,
bastante à vontade num personagem autoritário e solene). Embora seja retratado
durante a maior parte do tempo como alguém severo, Colliers é quem mantem sua
equipe unida e segura ao longo de todas as incertezas da guerra.
Quando um de seus condutores morre, um novo
membro se integra à já veterana equipe, o idealista e ingênuo Norman (o jovem
Logan Lerman).
De imediato, a equipe –formada pelo crédulo
Boyd (Shia LaBeouf, tentando e falhando como sempre), Grady (Jon Bernthal, uma
boa presença) e Gordo (o ótimo Michael Peña), todos brutalizados pelo combate
–rejeita seus modos civilizados e seu discurso de ética em meio à guerra.
As circunstâncias da guerra –ou melhor dizendo
as circunstâncias de todo o filme hollywoodiano de guerra –irão modificar essas
impressões: Colliers mostrará, na aridez do campo de batalha, que tem um
coração; Norman descobrirá sua própria capacidade de matar (e com ela sua
coragem); os outros soldados revelarão que são capazes de ser bons e leais
amigos; e todos formarão uma espécie de família (ainda que esses laços padeçam
de profundidade), cuja unidade será posta severamente à prova no desfecho.
Se há uma obra que parece orientar “Corações de
Ferro” num nível mais onipresente do que se poderia esperar, é “O Resgate doSoldado Ryan”: Da pirotecnia empregada sem modéstia por David Ayer, ao estilo
despojado de sua encenação, na estrutura de sua própria trama e até na proposta
do filme como um todo, tudo remete ao trabalho de Spielberg que foi tão
transgressor no fim dos anos 1990 quando foi lançado.
Da mesma forma. a premissa parece aproveitar um bocado a idéia central de um notável cult dos anos 1980, "A Fera da Guerra", de Kevin Reynolds, também ele quase todo ambientado dentro da tensão claustrofóbica de um tanque de guerra.
Alguém podia, no entanto, avisar David Ayer que
muita gente conhece tais filmes: Gente o suficiente para perceber o quanto o trabalho dele acaba indo muito além da mera homenagem ou referência.
Da forma como é concebido, “Corações de Ferro”
é tecnicamente bem feito o bastante para satisfazer plenamente àqueles
expectadores que gostam de um filme de guerra que prima pela ação, sem
importar-se tanto com a trama ou os personagens.
Quem esperar um capricho autoral que defina
melhor a construção das cenas ou o rumo das atuações, ou mesmo um trabalho onde
se possa identificar um esforço original de fato e não um arremedo de tudo que
já foi feito antes, poderá acabar tendo que exercitar a paciência.
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