Se não chega a ser um realizador magistral, ao
menos, Paul Schrader aprendeu com os melhores, tendo seu roteiro para “Taxi Driver” dirigido por Martin Scorsese, com quem colaborou em várias ocasiões.
“Marcas da Vingança” é um trabalho que oscila
assim entre um talento que quase alcança a excelência minado por circunstâncias que lhe impõe uma
quase mediocridade.
No que já de imediato parece ser um flaskback
(e de fato é) acompanhamos as lembranças pesarosas do protagonista todo desfigurado
–mas, mantendo uma pose de autoridade –em um avião.
É 1987 e a narrativa retrocede quatorze anos –iniciando
a trama assim em 1974.
Num hotel à beira-mar de Miami acompanhamos
Alan (Joseph Fiennes, de “Shakespeare Apaixonado”), o rapaz que virá a se
desfigurar; entretanto ali ele é o boa pinta camareiro do lugar e seus clientes
são o casal Brice, Mark (Ray Liotta) e Ella (Gretchen Mol).
Numa narrativa algo noir (uma paixão de
Schrader), o filme faz muito lembrar em sua primeira parte os desenlaces de “Corpos Ardentes” e demais produções onde o personagem principal invariavelmente se
envolve com a mulher errada –porque Alan vai, sim, se envolver com Ella. E a
obsessão por seu corpo e por seu amor será tanta que o rapaz não irá pestanejar
ao pegar um carro e ir atrás do casal na cidade onde moram.
Contudo, Mark é muito mais perigoso do que
parece: Quando a formação católica de Ella a obriga a confessar seu pecado à
Mark, ele usa de suas influências e incrimina Alan para que este vá preso por um
crime que não cometeu e, uma vez encarcerado, já está também planejado seu
assassinato.
Mas, Alan –com o rosto, o queixo e a mão
direita dilacerados por um tiro –sobrevive e, nos quatorze anos vindouros
prepara cuidadosamente sua vingança.
O filme de Schrader abandona então suas
similaridades com o film noir e se revela profundamente influenciado por “OConde de Monte Cristo” –como nessa premissa clássica, Alan muda de identidade
(agora é o poderoso e respeitado advogado Manny Esquema, visto no avião do
início) e planeja despedaçar Mark (que não o reconhece) aos poucos, incriminando-o,
tirando-lhe o dinheiro que tem e, por fim, levando-lhe a esposa.
É, portanto, um prato que se come frio, essa
tal de vingança.
Uma série de elementos soam inverossímeis no
filme de Shrader, que até diverte mesmo assim, mas os aspectos que de fato
depõe contra sua qualidade são ainda mais circunstanciais: o roteiro –ponto forte
de Schrader em detrimento de sua capacidade na direção –salta abruptamente no
tempo acarretando um lapso imenso entre a fase relembrada e o momento presente
(1987), deixando vários pontos obscuros acerca de como Alan ascendeu até se
tornar o Sr. Esquema ou em quais condições isso se deu; um problema que impede
a aproximação do público com o protagonista.
No papel principal, Joseph Fiennes oscila em
equívocos: Não tem autoridade o suficiente quanto o personagem exige dele e, no
mais, fica no registro do sofredor romântico como em outros de seus trabalhos.
Membro mais reconhecido do elenco, Ray Liotta –nota-se
–é ligeiramente reverenciado em cena, e essa adulação o faz perder um pouco o
controle da própria canastrice.
Até mesmo a encantadora Gretchen Mol, cuja
beleza e sensualidade tornam mais difícil julgar sua atuação, perde a mão de sua
caracterização em alguns momentos.
Ainda assim, junto com esses lapsos, como em outros trabalhos de Schrader, convive uma
inspiração e uma concepção de bom cinema que agregam qualidades indiscutíveis
ao todo, resultando num válido entretenimento.
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