O simbolismo fálico presente no título já
escancara as intenções de natureza sexual da premissa; embora esse fosse um
aspecto que, na teoria, os realizadores em geral buscavam ignorar.
Sim, pois, o giallo foi para os diretores
italianos uma oportunidade para inferir o erotismo que, nos suspenses elegantes
que lhe serviram de inspiração, era apenas sugerido –ainda que as cenas
picantes desta obra específica sejam até tímidas.
“A Cauda do Escorpião” começa com a fulgurante,
ainda que calculista Lisa Baumer (Ida Galli) que a narrativa mostra como uma
esposa sozinha e sintomaticamente adúltera.
Seu marido morre num acidente de avião na linha
Inglaterra/Grécia, e ela é agraciada com uma apólice de seguro orçada em um
milhão de dólares.
Seguindo para a Grécia onde a filial da
Companhia de Seguros irá lhe reembolsar, ela já vai deixando uma misteriosa
trilha de cadáveres: Pessoas ligadas a ela aparecem mortas, como um amante
viciado que aparentava ter provas de seu possível envolvimento no acidente que
vitimou o marido.
Atrás dela, orientado pela seguradora, vai o
detetive Peter Lynch (George Hilton, de “O Estranho Vício da Senhora Wardh”, do
mesmo diretor Sergio Martino).
Nesse ponto, o filme de Sergio Martino realiza
uma guinada cuja referência mais nítida é certamente “Psicose”, do mestre
supremo do suspense Alfred Hitchcock: Após seguidas mortes, e outras pistas que
mais distraem do que elucidam, a própria Lisa –que todos os indícios da
narrativa colocavam como protagonista da trama –é morta; tal e qual acontece,
de maneira surpreendente com Janet Leight no filme de Hitchcock.
Depois disso, o protagonismo passa para Lynch e
para a jornalista Cléo Dupont (a esplêndida Anita Strindberg, de “Todas As
Cores da Escuridão”, também de Martino) que engatam ao longo da trama um
romance.
É curioso notar que, devido à conceitos
mercadológicos bem sedimentados da época, as tramas dos gialli não fugiam muito
de sua zona de conforto enquanto narrativa, atendendo a uma mesma fórmula que
satisfizesse tanto público quanto distribuidores.
Com efeito, os diretores –que usavam quase
sempre os mesmos astros e estrelas à disposição –precisavam subverter a
expectativa do público que era alimentada por certos arquétipos em alguns
intérpretes.
Por exemplo, Anita Strindberg era o tipo de atriz
cujos papéis normalmente eram associados às vítimas frágeis em potencial dos
assassinos –e justamente por isso, Martino faz dela sua personagem mais central
e destemida aqui, o quê acarreta uma surpresa ao público.
O mesmo vale para outras presenças do elenco,
não só neste, mas em diversos outros títulos desse sub-gênero.
Com locações em Londres e na Grécia (o quê
representa um escopo luxuoso para um giallo), o filme de Martino traz um
roteiro de autoria de Ernesto Gastaldi visivelmente entusiasmado com
reviravoltas que, às vezes, soam até implausíveis. Nesse sentido, o desfecho é
de um primor desconcertante: Em meio ao clímax e à uma explicação meio sem pé
nem cabeça de como o ‘vilão-surpresa’ perpetrou suas diabruras é mencionado um
cúmplice.
Entretanto, por completa distração da mocinha
protagonista –ou por desleixo mesmo dos realizadores –esse cúmplice é
completamente esquecido. Só resta um personagem que se enquadra em seu perfil
no filme todo e é justamente ele quem acompanha a aliviada heroína na viagem de
carro que encerra o filme fazendo com que a atmosfera feliz da cena seja
contaminada por uma ligeira dúvida macabra.
Uma manobra proposital para terminar o filme em
suspense ou um lapso narrativo que passou despercebido?
Em se tratando dos travessos artesãos do giallo
daqueles tempos qualquer um dos dois é possível.
Nenhum comentário:
Postar um comentário