Realizado logo depois de “Os Trapalhões Na
Serra Pelada”, este “O Cangaceiro Trapalhão” conta com a direção de Daniel
Filho que, se não tem a competência habitual de J.B. Tanko ao menos é superior
ao convencionalismo que contamina o trabalho de Adriano Stuart.
Na trama, Renato Aragão é Severino, um humilde
e destrambelhado pastor de cabras do nordeste. Num tom e num ritmo remetentes aos faroestes antigos (e, ao contrário dos italianos, o cinema brasileiro
perdeu a chance de criar todo um sub-gênero baseado no cangaço que se
espelhasse nos faroestes) a sequência inicial elabora um tiroteio numa
cidadezinha desolada onde o bando de Lampião e Maria Bonita (Nelson Xavier e
Tânia Alvez, escolhas absolutamente perfeitas) se defronta com as precárias
forças policiais locais –e, para tanto, caracterizadas com sofreguidão.
Inúmeras coisas acontecem, denotando a perícia
de Daniel Filho na condução: Sobretudo, os quatro trapalhões têm seus destinos
entrelaçados (além de Didi, isto é, Severino, Dedé, aqui chamado Gavião, é um
dos cangaceiros a serviço de Lampião, enquanto Mussum e Zacarias são prisioneiros da
cadeia local que fogem aproveitando a confusão). Eles acabam numa carroça onde
está sendo transportado o objeto da cobiça de Lampião, uma caixa metálica
aparentemente mágica, cujas origens nunca são esclarecidas e que representa um dos poucos elementos místicos na trama –e, por incrível que possa parecer, ausentes do
enredo durante a maior parte do tempo.
O filme se ocupa mesmo de registrar a galhofa
absurda –e, sejamos honestos, deliciosa! –de ver o famoso quarteto às voltas
com uma figura tão severa e compenetrada quanto Lampião (e a atuação do sempre
maravilhoso Nelson Xavier compreende tal dinâmica de modo preciso): Uma vez
aceitos no bando, Lampião não tarda a descobrir uma peculiaridade; que
Severino, ao colocar óculos, é quase um sósia seu.
O plano, portanto, está montado: Enquanto se
ocupa do mistério até bem redundante da caixa mágica, Lampião deixa Severino
trajado com suas mesmas vestes a fim de confundir os policiais em seu encalço,
algo como um “Kagemusha” nordestino –e esse recurso não é assim tão incomum na
filmografia dos Trapalhões.
Severino acaba assim numa cidade onde quase é
encurralado por policiais em uma cilada, escapando por pouco graças à boa
vontade da jovem Aninha (Regina Duarte, no auge de sua fase “namoradinha do
Brasil”), com quem mais tarde se junta à procura de água e da filha de Lampião,
enquanto os outros três tornam a se reencontrar com os cangaceiros.
Ao lado de Aninha e da menina, Severino
encontra o que parece ser uma espécie de feiticeira do sertão (a deslumbrante
Bruna Lombardi), cuja presença abre as portas para elementos mágicos e efeitos
visuais hoje ultrapassados, mas eficientes e admiráveis. Ela até se oferece
para Severino acarretando um acesso de ciúmes de Aninha, o que leva ele a optar
pela jovem e continuar sua busca por água que, nas instruções da feiticeira,
estaria na “montanha em forma de galinha choca”!
Eventualmente, os Trapalhões voltam a se reunir
e o bando de Lampião volta a aparecer. Satisfeito com a filha devolvida,
Lampião –que, diga-se, nunca é chamado por esse nome –agradece deixando que o
quarteto parta em paz e lhes entregando, já desinteressado, a tal caixa mágica.
É então que, numa ponta relâmpago de Tarcísio Meira
(entrando mudo e saindo calado), Aninha encontra seu príncipe encantado e
abandona Severino que –numa jogada narrativa constante nos filmes dos
Trapalhões e que faz ainda uma mambembe referência à "Casablanca" –abre mão do amor dela (se era para ser assim, porque ela não deixou
que ele ficasse com a feiticeira de Bruna Lombardi?!).
No desfecho algo previsível, a caixa revela aos
Trapalhões o segredo para fazer com que a ‘montanha em forma de galinha choca’
bote gigantescos ovos de ouro, tornando-os milionários.
Divertidamente lúdico, descompromissado e fluido,
“O Cangaceiro Trapalhão” é uma obra saborosa que ombreia os melhores títulos
protagonizados no cinema pelo famoso quarteto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário