O comentário musical da trilha de Maurice Jarre
que abre o filme já deixa claro o vasto leque de possibilidades da obra de
Georges Franju: A música circense aliada às imagens soturnas estabelece a
atmosfera de “circo de horrores” que mais tarde serviu de influência para David
Lynch, Tim Burton e Pedro Almodovar (do qual “A Pele Que Habito” é praticamente
uma declaração de amor ao filme de Franju).
Na cena em questão, uma mulher (Alida Valli, de
“O Terceiro Homem”) conduz um carro dentro do qual uma moça, terrivelmente
vitimada de um ferimento no rosto, se acha desacordada. Na melhor tradição de
Hitchcock, essa mulher joga o corpo da moça num rio na intenção de livrar-se
dela.
Mais tarde, descobrimos por uma série de cenas
serenas e habilmente intercaladas que a moça desaparecida é uma dentre várias
vítimas que vêm intrigando a polícia.
Não tarda para que a narrativa de Franju deixe
de lado as investigações (que claramente não o atraem) para centrar-se na
figura do perpetrador de tais crimes: O cirurgião Dr. Genessier (Pierre Brasseur)
cujos experimentos de transplante de pele, para sua agonia, dão sempre certo
nos cães –que ele tem à disposição num canil em sua mansão –mas, não surtem o
efeito desejado em Christiane (Edith Scob), sua filha, dada como morta num
acidente, porém, na realidade, desfigurada terrivelmente, o que leva seu pai e
a secretária dele, Louise (personagem de Alida Valli), a procurarem
incessantemente por jovens da mesma idade que sirvam de cobaias involuntárias
para que Genessier possa ganhar um novo rosto –e, no processo, acabam
enfileirando mortes.
Poético, sombrio a partir de escolhas
inusitadas da parte de seu diretor e absolutamente marcante, “Os Olhos Sem
Rosto” é um dos mais marcantes filmes de terror europeu de todos os tempos e
certamente o trabalho de maior visibilidade e reconhecimento de Georges Franju
cujas obras –entre elas um número expressivo de documentários –por vezes,
giravam em torno de maus-tratos com animais e da crueldade humana; o que,
talvez, explique as alterações sofridas na premissa do filme em relação ao
livro que o inspirou, e o notável final, tão ambíguo quanto etéreo, onde
Christiane manda às favas as inescrupulosas e vãs tentativas do pai em
devolver-lhe uma vida que jamais terá novamente e libertar os animais cativos
–cães e pombas –para junto deles desaparecer em meio à floresta.
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