segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Cães da Noite


Faz lembrar indiretamente o clássico “A Embriaguez do Sucesso”, a forma com que o diretor Antoine de Caunes busca registrar a rotina de notívago do protagonista Antoine (Gillaume Canet): Não só ele como todos os personagens a sua volta e o próprio universo noturno a que pertence vivem e existem à noite para se dissipar durante o dia.
A vida prática de Antoine –cuja profissão é uma incógnita –é uma nulidade: Parasita social destituído de amor próprio (é um vigarista dos mais escorregadios), ele não tem sequer lugar onde morar; ao amanhecer, procura as dependências de um clube de banhistas, onde, se fazendo passar por associado, pode tomar banho e dormir nas esteiras à beira da piscina o dia todo. Ele vive para entrar em baladas disputadas onde come e bebe de graça –por vezes, conquistando a antipatia mortal dos guarda-costas que frequentemente burla.
Numa dessas ocasiões, Antoine se vale de um nome que ouviu pouco antes –um certo Jordan, considerado “o senhor da noite” –para conseguir acesso a uma festa de ricaços.
Contudo, o anfitrião tem especial interesse pelo tal de Jordan: Ao que parece, uma figura quase folclórica em certas rodas, Jordan é alguém que o milionário Abraham Von Bullow (Jean-Marie Wiling) procura a muito tempo.
A menção de Antoine a ele o coloca assim no meio da trama: Bullow promete pagar-lhe uma fortuna se conseguir colocá-lo frente a frente com Jordan.
Sem ter o que fazer e sem muita noção do perigo –e bastante interessado na grana –Antoine envolve seu amigo Etienne (Gerard Lanvin), na investigação, e tal procura o leva até a sedutora Violaine (a interessantíssima Asia Argento) e aquela que deve ser a cena mais memorável do filme: Na cama de um quarto de hotel, no que parece ser um interlúdio sexual carregado de submissão da parte dele, Violaine se despe na parte de baixo (os seios se mantêm cobertos por um sutiã fetichista) revelando a notável desinibição de Asia Argento nas cenas de nudez, quando ela também –no que parece ser um delírio alucinógeno –se multiplica em três, tal e qual as três noivas de “Drácula”.
A referência não é em vão porque “Cães da Noite”, entre sua jazzística atmosfera noir e seu clima erótico-europeu fetichista, vai se revelando também um filme de vampiros (!), mas não um filme de vampiros declarado e explícito: Gradativamente a narrativa intensifica sua sugestão de que Violaine e Jordan (que, mais tarde, descobre-se serem irmãos) possam ser criaturas da noite, chupadoras de sangue –ou, na teoria mais próxima do provável, pertencem a uma seita de pessoas convencidas de que são vampiros reais.
Impregnado de estilo (o qual acarreta um ligeira desprezo para com seu conteúdo genuinamente falho), este filme francês oscila entre um retrato cheio de modernismos das mais exóticas tribos noturnas e uma mescla deliberadamente desigual de gêneros cinematográficos –um objetivo cheio de pretensão e algo nebuloso que quase compromete a diversão de quem só vai assistir um bom filme.

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