Mais um título para a vasta lista de obras do
diretor francês Claude Chabrol na qual o adultério termina invariavelmente em
assassinato, “Uma Garota Dividida Em Dois” constrói, em sua primeira parte, as
bases de um triângulo amoroso com atenção às imprevisibilidades de uma
narrativa inconformista.
Parece deliberado o fato de Chabrol intercalar
as cenas –sobretudo, na introdução aos protagonistas –num corte seco, sem
qualquer sensibilidade às rimas visuais. É como se ele saltasse abruptamente de
um filme para o outro.
O primeiro “filme” vem a ser de Charles
Saint-Denis (François Berléand, de “O Concerto” e “Adeus, Meninos”), escritor
consagrado aos cinquenta e tantos anos que contempla uma vida confortável; tem
uma editora (Mathilda May, de Força Sinistra”) que se desdobra para satisfazer
seus caprichos e uma esposa (Valeria Cavalli) inverossivelmente compreensiva
–“Uma santa!” nas palavras dele próprio.
O segundo “filme” mostra a jovem Gabrielle (Ludivine
Sagnier), apresentadora do boletim meteorológico de um telejornal –e, mais
tarde, de outro programa –que aos poucos torna-se amante de Charles,
convertendo-se assim em mais uma das mulheres que lhe fazem todas as vontades.
Por fim, há Paul (Benoît Magimel), jovem
arrogante, desequilibrado e rico em quem Gabrielle desperta o interesse. No
entanto, Paul se ressente da evidente predileção da jovem pelos avanços de
Charles em desprezo às suas tentativas –o que o leva a transferir gradativa e
irreversivelmente o centro de todas as suas neuroses (e psicoses) para Charles.
Bem-sucedido em desviar a atenção do expectador
para o fato de que narra uma tragédia clássica, valendo-se de escolhas
narrativas imprevistas e inusitadas e de elipses notáveis, Chabrol pontua seu
filme com observações visuais que enfatizam aqui e ali a cor vermelha –na
sublimação de certo teor trágico, na atmosfera algo lasciva que ronda a
personagem de Gabrielle e nos rumos reflexivamente pungentes que confere à
trama.
Para os conhecedores de Chabrol, de sua
filmografia e de sua postura ética, o filme não chega a surpreender. Está mais
para uma reafirmação agradável e hábil das convicções morais de um grande
realizador.
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