Fenômeno literário, a “Trilogia Millennium”
escrita pelo falecido Stieg Larsson revolucionou o gênero policial
investigativo e introduziu a contundente personagem da hacker Lisbeth Salander
no imaginário popular e nas listas de protagonistas mais antológicas.
Da própria Suécia natal veio a primeira
adaptação em forma de minissérie (estrelada pela ótima Noomi Rapace) que mais
tarde, sob uma nova edição, foi lançada nos cinemas no formato esperado de
trilogia: “Os Homens Que Não Amavam As Mulheres”; “A Menina Que Brincava Com
Fogo”; e “A Rainha do Castelo de Ar”.
Na inevitável versão hollywoodiana (dirigida
com a habilidade de sempre por David Fincher), quem viveu Lisbeth (e ainda
levou uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz) foi Rooney Mara.
Todavia, no que tange à literatura, o sucesso
de “Millennium” não podia parar simplesmente pelo falecimento de seu autor (!),
e assim, foi encomendado ao escritor David Langercrantz que prosseguisse com a
história de Lisbeth Salander, emulando o estilo de Larsson e dando continuidade
ao interesse crescente dos fãs.
Com o sucesso relativamente tímido da versão de
Fincher –que embora excelente exigiu um orçamento considerável do estúdio –a
Sony Pictures decidiu por seguir em frente adaptando diretamente o livro
inédito, deixando de lado o segundo e o terceiro (embora, nesta produção a
trama de ambos continue valendo para a história), e optando por um novo diretor
(o jovem Fede Alvarez, que fez bonito no remake de “Evil Dead” e em “O Homem
Nas Trevas”), e um novo elenco.
O prólogo já dá uma perfeita ideia do que se
esperar de “ Garota na Teia de Aranha”: Uma Lisbeth Salander (a talentosa
Claire Foy) com ares de justiceira usa de seus recursos e sua mente estratégica
para dar o devido troco a um marido violento para com a esposa. O problema não
é, de modo algum, a cena que se segue (uma forma de introduzir Lisbeth como uma
protagonista já definida e definitiva, o que ela é de fato), mas o que dela
resulta; mais bem editada no trailer do que no filme, a cena revela de imediato
o acerco visual do diretor Fede Alvarez e expõe também o seu equívoco no tom e
no ritmo ao tratar o material.
É exatamente esse o lapso que afligirá o filme
que vem logo depois.
Há três anos sem estabelecer contato com Mikael
Blomkvist (Sverrir Gudnason), a arredia Lisbeth assume casos desafiadores para
qualquer especialista em internet. Um deles lhe chama a atenção: Um gênio
projetista (Stephen Merchant, de “Logan”) deseja que ela invada a protegida
rede da CIA e roube um programa que ele arrependeu-se de criar –um algoritmo
capaz de acessar num único clique todas as ogivas nucleares do mundo (!).
Depois do serviço feito, a complicação de
Lisbeth se revela de fato. Ela tem seu apartamento invadido. Quase morre, e o
precioso algoritmo lhe é roubado. Seu cliente pensa que o responsável foi ela
–que possivelmente quis guarda-lo para si –e procura pelos agentes suecos de
Inteligência. Para complicar ainda mais, os EUA despacham o agente Needhan
(Lakeith Stanfield, de “Corra”) para reaver o algoritmo.
No entanto, o grande problema está na real
identidade e nas motivações dos verdadeiros culpados: Um grupo terrorista
denominado “Aranhas” cujo líder é ninguém menos que a vingativa irmã de
Lisbeth, Camilla (Sylvia Hoeks, de “Blade Runner 2049”), cujo desejo de
destruir a vida da própria irmã se revela implacável.
Embora o filme se ampare nos intrincados e bem
elaborados artifícios que sedimentam o estilo notável e palpitante dos livros,
o trabalho do diretor Alvarez, ainda que consiga se impor à medida que a trama
avança, perde em comparação com as mais bem orquestradas e bem resolvidas
adaptações anteriores (seja a sueca ou a americana) que pareceram compreender
melhor os empuxos da trama e da protagonista.
Com efeito, é lamentável
que Claire Foy seja uma Lisbeth Salander tão brilhante e empática: Uma presença
magnífica que tem a infelicidade de estrelar a obra mais fraca a adaptar
“Millennium” até então.
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