quinta-feira, 28 de março de 2019

Os Homens Que Pisaram Na Cauda do Tigre

Numa de suas primeiras obras, o mestre Akira Kurosawa imerge de tal forma na cultura e na percepção japonesa que a narrativa deste trabalho soa quase inacessível a muitos expectadores ocidentais –uma observação e tanto para se fazer a um realizador acusado, em seu próprio Japão natal, de ser ocidentalizado.
É possível notar já em “Os Homens Que Pisaram Na Cauda do Tigre”, a atenção de Kurosawa a detalhes que viriam a compor um estilo singular como o movimento sincronizado (e carregado de diversos propósitos) de vários corpos em cena.
Imerso na dialética característica da poesia japonesa, Kurosawa narra um conto sobre um general e seus soldados que, no ano de 1185, tentam atravessar um entreposto florestal em pleno território inimigo disfarçados de monges.
No percurso, eles encontram um humilde camponês que por diversas razões e propósitos decidem levar consigo; o filme enxutíssimo que se segue (meros cinquenta e oito minutos de duração, quase um média-metragem ao invés de um longa) acompanha assim as tensões inerentes à circunstâncias dos disfarçados; assim como as dinâmicas de empatia e contradição que se formam entre personagens norteados por honra e ideologia.
Oriunda de uma peça tradicional do teatro Nô e Kabuki, a premissa que Kurosawa trabalha, como tal, assimila assim as linguagens de sua mídia original, convertendo sua condução cinematográfica, no desfecho, em uma elegia contemplativa de versos que inspecionam a angústia errante de seus personagens.
Em meio às notas de grandeza impar que Akira Kurosawa alcançaria em sua carreira, este singelo conto de perseguição e aventura assume-se como um acorde dissonante e tímido, naturalmente vindo de uma fase inicial de aprendizagem –para tanto, o próprio Kurosawa revisitou a mesma trama, sob diferentes ângulos, no extraordinário “A Fortaleza Escondida”, mas essa... é uma outra história.

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