terça-feira, 7 de maio de 2019

Jerry Maguire - A Grande Virada

Quando entregou o roteiro de “Jerry Maguire”, o diretor e roteirista Cameron Crowe não era tão reconhecido para além de pecha de promissor e ótimo escritor de diálogos –seus filmes até então restringiam-se aos simpáticos “Digam O Que Quiserem” e “Vida de Solteiro” –isso pode explicar porque ele teve lá seus contratempos e aborrecimentos com a realização do longa (reza a lenda que a Columbia Pictures exigiu que ele reescrevesse o roteiro trinta vezes!) e o fato do filme em si divergir um pouco de seu estilo e sua temática habituais na comparação com suas obras que vieram antes e que vieram depois.
“Jerry Maguire” é, em si, uma desconstrução de Cameron Crowe ao seu estilo mais moderno e atrelado ao romantismo dos novos tempos, das comédias de empuxo moral praticadas por Frank Capra.
A começar essa sua desconstrução, o filme de Crowe se permite começar onde quase todos aqueles outros acabavam: No momento em que o anti-herói descobre seu próprio caráter.
A partir daí, Crowe confronta esse personagem (interpretado com excelência por Tom Cruise) com os percalços espinhosos de sua escolha.
Jerry Maguire sempre foi um ótimo agente esportivo (profissão ilustrada com gracejo na cena inicial) e, portanto, dos muitos a explorar como abutres o talento dos atletas. Ao ser confrontado com a inesperada sinceridade infantil do filho de um esportista machucado, Jery tem, um dia, uma epifânia: Decide abandonar os objetivos mesquinhos e propor aos colegas de seu meio, que passem a pensar no melhor para seus atletas, valorizando assim o ser humano, e não o dinheiro que eles podem render.
É óbvio que Jerry acaba despedido, e tem, como única chance de manter-se nos negócios, um jogador encrenqueiro, impulsivo e ultrajante que ninguém quer representar, o incontrolável Rod Tidwell (Cuba Gooding Jr., vencedor do Oscar de Melhor Ator Coadjuvante e, de fato, roubando todas as cenas).
Ao seu lado, Jerry conta com a assistência de uma fiel secretária, encantada com seu súbito idealismo, a igualmente encantadora Dorothy Boyd (Renée Zellweger, revelada então neste filme).
Crowe molda assim uma graciosa comédia bem interpretada pelo trio central e roteirizada com perspicácia, valorizando justamente as circunstâncias e as dinâmicas que surgem eventualmente: O romance algo relutante entre Jerry e Dorothy, que não chega a explodir na tela, mas, se concretiza gradualmente em diálogos cheios de meiguice (“Você me ganhou no Olá!”) e pequenos detalhes; as aflições profissionais e pessoais do ótimo personagem Rod Tidwell às voltas com o racismo do meio e com as consequências de sua própria petulância (tão rica é essa faceta que ele poderia ganhar um filme só seu!); e as seguidas desilusões de Jerry em sua estoica tentativa de contrariar o cinismo e a vilania predominante em seu ímpeto.
“Jerry Maguire” não é o melhor trabalho de Cameron Crowe, e provavelmente não ocupa o topo da lista de nenhum de seus envolvidos, mas é bem construído e bem feito em todos os aspectos a que se propõe.

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