Ao incorporar as ambiguidades humanas
potencialmente capazes de aflorar num ambiente teoricamente reto e certo como o
militarismo (a Marinha, neste caso), e transpor tais ideias, presentes na obra
de Herman Wouk, vencedora do Prêmio Pulitzer, com alguma eficiência para a tela
de cinema, o filme do diretor Edward Dmytryk, dialoga de certa maneira com
“Sindicato de Ladrões”, de Elia Kazan, ambos lançados no mesmo ano, e ambos
indicados ao Oscar por suas inquestionáveis qualidades artísticas (“Sindicato...”
terminou vencedor).
Assim como Elia Kazan, Dmytryk foi um diretor
relacionado ao comunismo durante os anos 1950, integrando a lista negra do
Senador Joseph McCarthy. E assim como Kazan, ele declinou de suas convicções
ideológicas para delatar companheiros e permanecer em atividade em Hollywood.
No subtexto que acompanha “A Nave da Revolta”
temos, então, uma trama que se debruça a explicar e justificar um julgamento
onde um ato, em princípio condenável –o motim contra um oficial superior
–adquire ares dúbios diante das personalidades dos envolvidos e dos detalhes
minuciosos e pertinentes que passaram despercebidos.
Com efeito, até mesmo o personagem
possivelmente visto como o vilão, o militar em julgamento, é reiterado como
mais uma vítima das circunstâncias.
A bordo do U.S.S. Caine, um velho navio de
guerra destinado a executar a varredura de minas marítimas durante a Segunda
Guerra Mundial, o jovem oficial Keith (Robert Francis) se depara com a
instabilidade crescente do novo comandante, o capitão Queeg (Humphrey Bogart
num de seus mais espetaculares trabalhos), cujos rompantes de indignação para
com condutas irrisórias dos recrutas, as ordens estapafúrdias dadas com rigor
descabido e a constante impressão de hostilidade intelectual para com os demais
oficiais podem indicar um quadro preocupante de paranóia.
Aliado aos preocupados oficiais Maryk (Van
Johnson) e Keefer (Fred MacMurray), Keith chega a cogitar uma audiência com um
almirante a fim de denunciar seus temores de uma complicação iminente. Ela
surge, entretanto, durante uma tempestade que ameaça virar o navio, o que
obriga o Tenente Maryk a destituir o negligente Queeg de seu posto de comando.
Conduzidos por esse exaspero, os personagens
são assim levados ao julgamento que ocupa o terço final do filme, quando Maryk
deve ser submetido à corte marcial e a dúvida –teria ele ou não se amotinado?
–respondida.
Seu defensor é o niilista Tenente Greenwald (o
magnífico José Ferrer).
Compreendendo intrinsecamente
as complexidades movediças e existenciais que uma circunstância assim acarreta
(refletidas com perfeita noção de analogia em suas próprias experiências), o
diretor Dmytryk vislumbra as implicações humanas que se entrevê através da
suposta solidez de conduta moral vigente na Marinha, e ressalta as margens de
erro improváveis com este roteiro relativamente bem equilibridado no seu ritmo
e na sua administração dos fatos –o roteirista Stanley Roberts só não domina
com destreza as passagens que tentam ilustrar o relacionamento amoroso de Keith
em conflito com sua harmonia familiar, tópicos, no entanto, que estão longe de
serem centrais ao filme.
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