terça-feira, 6 de agosto de 2019

Sexy Por Acidente

A atriz e comediante Amy Schumer é a mais perfeita tradução norte-americana do cinema moderno para a personagem britânica de “O Diário de Bridget Jones”. Claro que Renee Zelwegger incorporou-a com perfeição  no filme de 2001, mas Amy Schumer vai além de um bom desempenho no papel; ela leva essa adequação para o mundo real.
Foi assim com o ótimo “Descompensada”, o filme que certamente a revelou, e é assim neste “Sexy Por Acidente” que mesmo não equiparando a mesma qualidade, ainda assim orbita as mesmas angústias femininas que já ditavam a narrativa daquele filme anterior.
Talvez até para efeitos de referência, a personagem de Amy, aqui, se chama Renee. E ela é uma coleção ambulante de todas as inseguranças da mulher moderna: Tem baixa alto-estima (salientada nas constrangedoras situações cotidianas mostradas já no início), briga com a balança (o que a leva a protagonizar sucessivas gafes na academia que frequenta) e amarga um emprego que não lhe satisfaz (num subsolo onde sua única companhia é o personagem hilariamente melancólico vivido por Adrian Martinez).
Tudo começa a mudar para Renee quando, num acidente com uma bicicleta ergométrica, ela bate a cabeça e, a partir daí, (talvez inspirada por um pedido feito numa fonte dos desejos na noite anterior) passa a acreditar que seus sonhos foram atendidos e ela se tornou linda!
Entretanto, o expectador e todos os demais coadjuvantes percebem a verdade; que absolutamente nada mudou (!) e ela continua a mesma.
Sua atitude, porém, é outra: Convicta de que agora é bela e sexy, Renee se candidata ao cargo de recepcionista de Avery Leclaire (Michelle Williams), um emprego que outrora ela jamais ousaria almejar; e passa a paquerar homens na rua, descolando até mesmo um namoro com o boa-praça Ethan (Rory Scovel).
Na mensagem algo non-sense do humor norte-americano que exibe (e que se baseia numa comédia de vergonha alheia que não agrada ao público com unanimidade), “Sexy Por Acidente” quer deixar um recado bem claro às suas expectadoras: De que a auto-confiança é tudo, e por mais que não pareça, é muito mais válida nas relações interpessoais do que uma bela estampa.
Na trajetória que os diretores Abby Kohn e Marc Silverstein (também roteiristas) escolheram para expor essas ideias, os percalços experimentados pela personagem principal se sucedem com relativa indulgência, embora não lhes falte sagacidade e polimento –algumas situações podem remeter impressões similares ao do clássico “Muito Além do Jardim”.
E Amy Schumer é, com frequência, uma força da natureza. Não há um instante de hesitação quando ela demonstra seu inconformismo diante do comportamento cafajeste e seletivo dos homens em geral diante de mulheres mais ou menos feias (a participação da top-model Emily Ratajkowski é notável); ou quando assume a certeza de que ficou bela em sequências que poderiam representar o ponto frágil do filme caso não houvesse ali uma atriz convicta e destemida. “Sexy Por Acidente”, no entanto, deixa de ser uma comédia oscilante entre o constrangedor e o afiado quando adentra sua meia hora final e diz a que veio –quando um novo acidente faz Renee, digamos, ‘voltar ao normal’ com toda sua insegurança e incerteza sobre si mesma.
O filme então começa a empolgar de verdade ao colocar a protagonista diante de conquistas improváveis no âmbito profissional, romântico e pessoal, confrontada, porém, por toda sua vulnerabilidade e pela ilusória constatação de que foi tudo um passe de mágica –e é desnecessário dizer que, por isso mesmo, Amy Schumer brilha, no domínio pleno do humor que demonstra.
Se depender da iniciativa da atriz, haverão muitos filmes ainda protagonizados por ela, a abordar com bom humor as facetas íntimas e irônicas de ser mulher no mundo de hoje.

Nenhum comentário:

Postar um comentário