Dizem que para os atores, o drama é uma energia
que se recolhe para dentro e a comédia uma energia que se emana para fora.
Ao descobrir-se como diretor de cinema, o ator
Selton Mello descobriu também formas novas de aproveitar sua desenvoltura como
intérprete –“O Palhaço”, seu segundo filme como diretor, é o primeiro onde ele
coloca a si mesmo como protagonista; e o único até então, onde ele tentou tal
coisa. Isso talvez explique a imensa identificação que ele estabeleceu com o
personagem Benjamin, filho do dono do circo, palhaço no picadeiro,
pau-para-toda-obra fora dele.
Ele é um dos muitos integrantes do Circo
Esperança que singra as cidades do interior brasileiro –numa tradição que
certamente remete a infância dos expectadores hoje adulto; e numa exaltação da
arte circense que remete algo de Federico Fellini.
Embora seja seu pai (Paulo José, maravilhoso) o
dono do circo, e não lhe falte energia para namorar a cuspidora de fogo
(Giselle Motta), contabilizar o lucro e ser também ele palhaço, sobra para
Benjamin a parte nada divertida do trabalho: As queixas dos demais
funcionários, a diplomacia para com pessoas de fora, as carências inevitáveis
desse meio de vida.
Dizer que Benjamin obedece aquele máxima de que
todo palhaço é triste seria versar na redundância: Benjamin é todo desilusão e
infortúnio. Quando sofre, até sua dor parece uma piada pronta para divertir
outrem (caso da jovem, com quem ele alimenta a esperança de construir um
relacionamento, mas acaba se equivocando). E mesmo suas fixações –ventiladores
(os quais nunca tem dinheiro para comprar) e a carteira de identidade (que ele
não tem, mas pedem em todo lugar que vai) –passeiam pela melancólica
possibilidade de soarem patéticas.
O medo de ser engraçado fora do âmbito que lhe
cabe é o grande drama de Benjamin.
Daí sua opção de, em algum momento, partir do
circo, e seguir seu próprio destino, naquele dilema eterno, entre o drama e o
humor, a tragédia e a comédia, experimentado no cotidiano e na vida por todos
nós.
Numa narrativa preciosista
–que lembra muito o estilo de Wes Anderson –o diretor Selton Mello segue seu
protagonista de perto, mas não deixa de prestar imenso carinho e atenção aos
seus outros personagens: O próprio pai que, na implausibilidade de seu romance,
sabe estar sendo enganado pela jovem que ama, mas protela essa decisão até o
último instante; os dois músicos que sempre choram por dinheiro a fim de
atender os fictícios familiares doentes; o ajudante de palco perturbado por
recorrentes sonhos com cabras; o inseguro homem forte cuja bravura cede à
primeira crítica; e a garotinha vivida por Larissa Manoela, que de certa
maneira representa toda a luz e esperança num amanhã melhor –e a quem é
reservada a tarefa de encerrar o filme com otimismo.
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