“Go ahead, punk! Make my
day.”
A afirmação embutida nas palavras pesadas do
policial Harry Callahan –cujo apelo, no fim das contas, é intraduzível para o
português –dá perfeita noção do teor beligerante e sardonicamente fascista do
personagem; e isso se enfatiza quando sabemos que tal sentença é dita com ele
segurando sua famigerada arma, uma Magnum 44, contra a cabeça de um criminoso
rendido.
Oriundo do cinema sem muitas concessões dos
anos 1970, “Perseguidor Implacável” não abraça a ideologia de seu protagonista,
mas também não a problematiza: À beira de ser um vigilante urbano que faz
justiça com as próprias mãos, o policial Callahan é apelidado pelos colegas da
jurisdição de ‘Dirty Harry’ (Harry, o Sujo), devido à sua disposição
casca-grossa em fazer o que os outros, em geral, não fazem –e de ter estômago
para realiza-lo.
O caso do qual testemunhamos Callahan se ocupar
é de um assassino cujas atrocidades têm ganhado o clamor popular da abalada
comunidade de São Francisco; e as similaridades com o caso real do Zodíaco –psicopata
lendário nunca capturado cujas atividades se deram no período em que o filme
foi produzido –não são coincidências.
Nem tampouco clichês: O filme dirigido por Don
Siegel não se detém na busca pelo assassino como se poderia deduzir. O
‘Scorpion’, como ele é chamado aqui (interpretado com ameaçadora petulância por
Andrew Robinson), até não demora muito a ser preso; numa sequência formidável
que serviu de modelo para inúmeros filmes policiais que se prezam e que vieram
depois. Na verdade, o que o roteiro escrito por Harry Julian Fink, Rita M. Fink
e John Milius, em colaboração com Terence Malick (o lendário diretor de “Além da Linha Vermelha” e “A Árvore da Vida”), quer mesmo é colocar em perspectiva a
percepção da lei e do crime, do certo e do errado, e a sua execução prática
junto a um âmbito de ambiguidade moral.
O bandido vale-se da inconstância da opinião
pública e da imprensa sensacionalista para posar de coitado, trazendo as
críticas para o procedimento da polícia –e ter um tira da truculência singular
de Dirty Harry Callahan em seu encalço torna-se um prato cheio –e conseguindo,
com isso, liberdade e impunidade para tornar a praticar sua perversidade.
A violência desmedida é mais intolerável quando
se expressa do lado da lei, ou do lado do crime? –é o que o filme, em seus
momentos mais poderosamente reflexivos parece perguntar ao expectador; sem, no
entanto, oferecer maiores indícios de resposta.
Em vez disso, ele comparece com uma atmosfera
densa e intensa, um protagonista sólido, intransigente e sem concessões (e que
encontra em Clint Eastwood uma personificação hipnótica) e uma narrativa
amparada numa visão niilista e corrosiva da dicotomia entre a força policial e
a bandidagem, moldada no tom realista e quase sempre ultrajante daquele
período.
Todos pormenores que
conduzem às atordoantes sequências finais do filme, onde Dirty Harry toma a
decisão de quebrar completamente as regras e empregar seus métodos nem um pouco
ortodoxos na neutralização definitiva do criminoso.
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