segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Lady Chatterley

Certamente interessou ao diretor inglés Ken Russell o teor escandaloso presente nas obras literárias de D.H. Lawrence, tendo ele adaptado “Mulheres Apaixonadas” e sua prequel “O Despertar de Uma Mulher Apaixonada” –era como se Russell se identifica-se com a insistente postura de Lawrence em chocar seus pares afrontando a moral vigente; com filmes frequentemente desafiadores e controversos (e que por vezes reservaram à sua carreira uma espiral de altos e baixos), a postura de Russell enquanto realizador cinematográfico foi exatamente essa.
Outro indício da relação estreita entre esta obra adaptada com os títulos representativos da carreira e da personalidade de Ken Russell é, aqui, a escalação da bela Joely Richardson como protagonista –ela, que é filha de Vanessa Redgrave, mesma atriz empregada por Russell no horripilante “Os Demônios” no complexo papel de Madre Joana dos Anjos, e irmã da falecida Natasha Richardson, presente por sua vez em “Gothic” como Mary Shelley.
Joely é a jovem Constance, cujo marido, Sir Clifford Chatterley (James Wilby), sofre um acidente que o deixa paralítico.
Embora o amor pelo marido se mantenha, torna-se um fardo para Constance ser jovem e ardente num matrimônio cujas injustiças do destino abreviaram num afeto platônico –numa cena paradoxalmente excitante e melancólica ela exibe seu corpo nu para ele numa ânsia por alguma expressão de desejo que Clifford não possui mais.
E dessa involuntária necessidade carnal surgem as pulsões que a levam até o rude Mellors (Sean Bean), o guarda-caça da mansão, com quem Lady Chatterley passa a ter encontros extraconjugais numa cabana em meio à floresta.
Lá, ela e seu amante experimentam o arrebatamento da paixão física que ela, com seu marido, já não pode almejar –e nessa dinâmica, Russell investiga os reais tópicos de culpa de uma mulher cujo pecado foi deixar-se guiar por instintos inerentes à ela, num aproveitamento em cores quentes de todo o erotismo a que se tem direito (e a nudez de Joely Richardson é um fetiche que ele utiliza e reutiliza sistematicamente), como também na ênfase de contravenção existente numa premissa que se atreve a unir em circunstâncias tão íntimas dois indivíduos de classes sociais tão opostas.
Entretanto, no rumo de tragédia clássica que sabemos ser o cerne da obra, os excessos de Lady Chatterley levam a uma consequência irrevogável –ela engravida! –e esse fato não é apenas a confirmação de seu adultério, como também o ponto de não retorno no qual uma escolha dolorosa e irreversível se fará necessária da parte de Lady Chatterley e de seu marido.
Uma dentre tantas versões que “O Amante de Lady Chatterley” ganhou no cinema, esta de Ken Russell teve sua origem como uma minissérie da BBC de Londres, exibida em quatro episódios no ano de 1993, no entanto, aqui no Brasil e em boa parte do resto do mundo, ela foi lançada nas salas de cinema em uma versão reduzida (cento e dez minutos de duração) que, embora resumisse a trama e seus desdobramentos de ordem melodramática preservava o elemento pelo qual Ken Russell era reconhecido: O escândalo de cunho sexual.

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