Quatro filmes depois, o célebre personagem do
samurai cego já era um reduto ao qual o ator Shintaro Katsu se sentia
confortável. Sua quarta aventura se equilibra com alguma desenvoltura entre um
filme comercial que busca se manter por si só, com começo, meio e fim, bem
definidos e todas as informações pertinentes devidamente esclarecidas dentro de
sua duração, e o fato presente em menções, referências e pequenas pistas de que
muito do que se desenrola aqui teve seu princípio ocasionado em algum dos
filmes anteriores.
Devido aos acontecimentos dos três filmes
anteriores, Zatoichi tem sua cabeça colocada a prêmio por nada menos do que
quatro clãs yakuza diferentes (!), o que explica, logo no começo, a avidez com
que um jovem pobre tenta atacá-lo desprevenido.
Zatoichi o mata em legítima defesa, mas isso
não o impede de procurar pela mãe do infeliz e prestar-lhe alguma ajuda.
Entretanto, a mãe do rapaz é empregada na casa de Kanichi (Jun’ichirô Narita),
jovem ascendente na hierquia da yakuza local, fator que trata de envolver
Zatoichi em contratempos que ele desejava evitar.
Em meio a inúmeras intrigas e conspirações (que
comparecem, neste roteiro, em intensidade muito maior que nos filmes
anteriores), Zatoichi reencontra Otane (Masayo Banri), um amor do passado –e
que chegou a dar as caras no primeiro e no segundo filme –no entanto, agora as
coisas estão diferentes: Otane vive com um samurai rude e calado (Jutarô
Kitashiro), contratado de um dos senhores da yakuza que representa, neste
filme, o maior desafio para Zatoichi; ele almeja uma chance de matar o samurai
cego cuja fama no Japão feudal cresce cada vez mais em função de suas façanhas.
Numa fórmula já testada, comprovada e executada
com bastante especialidade pelo diretor Tokuzo Tanaka (diretor deste e do filme
anterior, as duas primeiras aventuras em cores do personagem), todos esses
tópicos conduzem ao entrecho final, um dos mais eletrizantes e bem acabados da
saga, onde o protagonista se vê encurralado numa antiga casa caindo aos pedaços
à beira do lago, com dezenas de samurais à sua espera lá fora, e vários
personagens e suas próprias motivações a confrontá-lo lá dentro.
Roteirizado por Seiji Hoshikawa, estreante na
série, “Zatoichi, O Fugitivo” carrega elementos ligeiramente diferenciados que
espelham a personalidade desse novo roteirista, como um interesse maior e
renovado por intrigas políticas e, como consequência disso, um número maior de
coadjuvantes a dividir a tela com o protagonista, e outras características como
a ambiguidade emocional presente no desfecho –quando uma dúvida acerca da
lealdade de Otane para com Zatoichi paira no ar –e o emprego de um antagonista
desta vez sem maiores ligações esboçadas com o personagem principal, o que faz
dele quase uma força da natureza a se impor contra o herói. Um adendo inédito,
sem dúvida.
Se em tudo o mais “Zatoichi, O Fugitivo” flerta
perigosamente com a repetição de padrões que se apresentaram em todos os outros
filmes –o início e o final são terrivelmente similares a despeito dos esforços
do diretor para dar-lhes uma roupagem distinta –ao menos, seu encerramento tem
uma pequena nota dissonante de melancolia.
Numa singela dança, tão
evocativa quanto comemorativa, Zatoichi parte de mais uma aldeia, deixando
alguns personagens para trás e outros tantos cadáveres amontoados. Uma amargura
que o herói, em sua grandeza, busca ocultar dos demais, mas que o ator Shintaro
Katsu, em sua maestria, deixa bem expressa para o expectador.
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