domingo, 23 de agosto de 2015

A Árvore da Vida

A minha relação com esse filme sempre foi um pouco complicada. Na primeira vez que o assisti, eu detestei. Achei o trabalho do diretor Terence Mallick (cujo "Além da Linha Vermelha" eu não havia gostado muito uns anos antes) um bocado pretensioso, seu senso de narrativa submetia muitas vezes o expectador à uma experiência extenuante ao adotar um arco narrativo -lá pela metade do filme -completamente distinto daquele que elaborava até então, e sua lentidão, aliada às inúmeras cenas de sentido metafísico e à sucessão de momentos abstratos transformava sua obra num desafio à vontade de assisti-lo.
Mas, algumas coisas não queriam me sair da cabeça, como por exemplo, a personagem interessante de Jessica Chastain, e a maneira como ela é retratada ao longo de todo o filme, além de muitos momentos que me intrigavam e conferiam ao filme uma rara beleza, difícil de ignorar. Assim, resolvi assistir mais uma vez.
Hoje, posso dizer que, na época, minha mente ainda não havia alcançado a mente do artista. E a minha confissão só não é mais frustrante porquê acredito que muitos foram os que passaram o mesmo que eu.
De início, "A Árvore da Vida" não é realmente um filme fácil.
Ele se resume, falando grosseiramente, a uma série de fragmentos da vida, mostrados numa sucessão por vezes estranha de acontecimentos: O crescimento e a educação de três irmãos nos EUA, agravado pelo amor incondicional da mãe (Jessica Chastain) e pela agressividade reprimida (e repressora) do pai (Brad Pitt), que se reflete, mais tarde, na propensão para violência do filho mais velho.
Numa segunda linha narrativa, o menino, já adulto (e interpretado por Sean Penn), se vê assombrado por suas memórias de infância, em especial, as do irmão do meio, cujo destino trágico nunca é devidamente esclarecido pelo filme.
Já, numa terceira linha de narração, uma tênue analogia relaciona esses fatos com o surgimento da vida na Terra, numa sequência cuja única referência possível é "2001 - Uma Odisséia no Espaço" de Kubrick.
"A Árvore da Vida" é, portanto, como uma pintura: Está exposta para a apreciação, e cabe a cada observador extrair dela uma sensação, um significado, a partir de suas próprias e particulares interpretações. Ainda que seu silêncio (e o de seu autor) confiram perturbadora dúvida acerca de sua intenção.
Não há como penetrar na mente do recluso Terence Mallick para tentar fazê-lo dizer o quê ele pretendia com "A Árvore da Vida", e talvez, sua resposta acabasse sendo muito vaga mesmo...
Mas, do ponto de vista cinematográfico, ele é espetacular.
O modo como é trabalhada a imagem torna este poema visual um dos mais emblemáticos exemplos de arrojo técnico do início deste século. E um filme que sobrevive, e muito bem, a uma comparação tão explícita ao quintessencial "2001" (e acredite, os paralelos são inúmeros!) não deve jamais ser desprezado.
A atriz Jessica Chastain lembra demais Liv Ullmann (atriz recorrente em inúmeros trabalhos de Ingmar Bergman), e como os personagens dela, o de Jessica é submetida a uma poderosa carga de dor emocional numa aparente referência que jamais saberemos se foi proposital ou não.

Hoje, posso dizer que incluiria "A Árvore da Vida" sem pestanejar, entre os 100 melhores filmes que já vi. Além de seu mistério, e de sua fascinante riqueza cinematográfica, ele é aquele tipo de filme que se transforma a cada nova revisão (pode-se perceber, uma vez ou outra, as nítidas referências religiosas, as tintas autobiográficas do próprio Mallick, ou os detalhes de sua visão do fim do mundo...), de maneira que ele não apenas é um único filme, mas vários, aprisionados e encapsulados numa só obra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário