Sam Peckinpah foi um daqueles grandes e
incompreendidos cineastas que atreveram-se a usar a luz projetada na tela de
cinema para trabalhar angústias e inquietações inerentes a sua própria
natureza. Profundamente ligado à um modo de vida mais rústico e rural, ele
identificava-se particularmente com as tramas de honra e sacrifício saídas do
gênero faroeste.
Lá, ele concebeu alguns trabalhos de primeira
grandeza. Este é, por muitos, tido como o seu melhor.
Após um violento tiroteio em plena praça
pública, um bando de foras-da-lei já vislumbrando uma aposentadoria da vida de
tiros e morte, toma o rumo para o México, um tanto divididos por discórdia e
desentendimentos. No seu encalço está um veterano xerife, com contas a acertar,
inclusive, com o líder do grupo, por quem nutre conflitantes sentimentos de
adversidade e camaradagem.
Este foi o último faroeste do diretor Sam
Peckinpah, e para tanto, ele tingiu seus personagens com tintas ambíguas
apagando as linhas divisórias entre mocinhos e bandidos, obtendo assim o único
tom que julgava adequado ao narrar uma crepuscular história sobre caminhos que
chegam ao seu fim.
No processo, ele encheu esta espécie de requiem
com cenas pródigas de violência e sanguinolência, como forma de contrastar o
romantismo dos faroestes do passado com a visceralidade realista que só
chegando perto do fim, os homens são capazes de entender. A preencher a tela,
durante esse ínterim, temos suas magníficas cenas em câmera lenta, onde Peckinpah
dissecava os momentos de violência com sua apurada dispersão de tempo,
obrigando o expectador a olhar a perversidade dos pequenos detalhes de momentos
terríveis que compunham o gênero tão apreciado e idolatrado.
Uma violência que regurgitava a própria
violência.
Poucos foram os visionários que lograram obter
uma forma de arte assim, tão pura no entendimento de seu propósito, tão precisa
na incisão cirúrgica de sua discussão: Spielberg em seu “O Resgate do Soldado
Ryan”, certamente Stanley Kubrick em seus “Glória Feita de Sangue”, “Laranja
Mecânica” e “Nascida Para Matar”, Martin Scorsese, sem sombra de dúvida, com
seu “Taxi Driver”, Oliver Stone nos seus bons momentos (leia-se, em “Platoon”,
“Salvador-O Martírio de Um Povo” e “Nascido Em 4 de Julho”), e certamente o
mestre maior, Akira Kurosawa, com “Ran”, “Os Sete Samurais”, “Trono Manchado de
Sangue” e “Kagemusha-A Sombra do Samurai”.
É portanto, em boa
companhia, que Sam Peckinpah e seus faroestes desmistificadores estão.
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