quinta-feira, 14 de julho de 2016

A Maldição da Serpente

Longe de ser o melhor trabalho de Ken Russell, esta curiosa tentativa de criar uma diferenciada vertente do vampirismo é uma boa oportunidade de conferir o diretor inglês exercitando um bom humor que enche de charme a narrativa.
Por vezes me fez lembrar as presepadas de Jess Franco, que sempre valeu-se da maleabilidade do gênero para subverter o conceito dos vampiros, ainda que seja absolutamente injusto estabelecer qualquer comparação entre a metódica transgressão de Russell e os trabalhos do espanhol abilolado.
"A Maldição da Serpente" já começa curioso quando Russell trata de introduzir toda a mitologia criada para sua vampira através de uma música regional: Terror e musical combinados numa narrativa desigual.
A vampira de Russell, Lady Sylvia Marsh (interpretada por Amanda Donohue, cujo papel pedia por uma atriz um pouco mais exuberante) não tem menas relação com morcegos (aos quais vampiros são normalmente associados), e mais com cobras, incluindo as características presas, que soltam um veneno paralisante para suas vítimas.
Em comum com os vampiros convencionais, a vampira concebida por Russell tem uma aversão pelos símbolos religiosos, como visto na cena em que espirra veneno numa cruz, ou nas elipses delirantes onde uma enorme serpente se intromete na crucificação da Cristo: Essa postura diz muito sobre o próprio Russell, visto que cenas de tom semelhante apareceriam também no muito melhor resolvido "Viagens Alucinantes".
A cidadezinha rural inglesa que serve de morada para Lady Sylvia é visitada por um jovem arqueólogo (Peter Capaldi, irreconhecível se lembrarmos somente de sua encarnação envelhecida de "Dr. Who") que muito se interessa pelos fósseis reptilianos que encontra na propriedade pertencente à duas irmãs (uma delas, Sammi Davis, que contracena com Donohue em "O Despertar de Uma Mulher Apaixonada").
Tudo tem relação com uma adoração ancestral por serpentes, que terminou trazendo Lady Sylvia ao lugar. E os subsequentes ataques dela à alguns dos personagens logo despertarão a necessidade de que alguém dê um fim a esse perigo.
A intenção de Russell em explorar de maneira original o conceito do livro de Bram Stoker, ainda que não de todo desperdiçada, rende um trabalho menor, onde o cineasta pareceu aproveitar a chance mais para relaxar mesmo: Embora muito do seu estilo seja plenamente identificável, é curioso perceber que ele fez um filme de terror até leve para os seus padrões, uma vez que muitas são as cenas que oferecem oportunidade para Russell trabalhar os excessos que ele sempre soube manipular tão bem.
As cenas de nudez, por exemplo, são tão breves que quase inexistem, e os momentos sanguinolentos são ainda mais tímidos, o quê é redundante, visto que o gênero de "filme de vampiro" dá margem para a utilização intensa desses elementos, até como seus simbolismos indissociáveis fundamentais. Todavia, este é um raro momento em que Russell parece apenas querer divertir.
O diretor inglês, desta vez, pegou leve. Uma pena...

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