quarta-feira, 6 de julho de 2016

Morrer Ou Viver

O início do filme é insano (e insanidade parece ser uma palavra muito apropriada ao universo cinematográfico de Takashi Miike): Trata-se de um turbilhão sensacional de imagens, onde basicamente um grupo de jovens promove um extermínio entre membros da Yakuza, a máfia japonesa. Logo aí, Miike dá seu recado: Eis um artesão de imagens que não prescinde de grandes orçamentos, efeitos digitais ou o apoio dos estúdios para manipular as mais variadas possibilidades do cinema, e com elas conceber cenas de uma genialidade inconteste.
O recado em si é também, uma faca de dois gumes: Se é na companhia de uma diretor genial e incansável que estaremos nas quase duas horas magníficas e inesperadas que se seguirão, é também com alguém de índole feroz, disposto a levar o filme e quem atrever-se a assisti-lo ao limite, com instantes que não apenas desafiarão a lógica, mas também o bom senso, o tradicional, e as próprias convenções de cinema comercial arraigadas em nós mesmos.
Após a delirante abertura que expõe os personagens principais, assim como a indomável personalidade de seu realizador, descobrimos que alguns desses jovens têm procedência chinesa e, subentende-se, que suas ações visam algum tipo de vingança. Mas nada é, de fato, comprovado no filme de Miike.
Seus personagens –os protagonistas inclusos –não são mais do que tipos, em especial o taciturno, vingativo, normalmente silencioso e constantemente emblemático “herói” trajado de sobretudo interpretado por Riki Takeuchi. Dele, sequer temos vislumbre das emoções, sempre mascaradas pelo verniz de uma impassibilidade típica de durões do cinema moderno.
O personagem de Sho Aikawa, o policial que investiga as ações de todo esse grupo de amigos, infiltrados em diferentes círculos de várias facções da yakuza, é quem mais tem a chance de demonstrar alguma emoção (ou qualquer elemento humano), e seus ocasionais momentos com a família. Embora no fim, isso sirva apenas para potencializar a crueldade implacável de Takashi Miike para com os habitantes deste seu mundo torpe.
No final das contas, o que todos eles querem é lucrar, de uma forma ou de outra. E Miike reserva assim toda a sorte de absurdos como castigo aos que ousaram compor sua fauna desigual de figuras mundanas. Seu filme é estranho, sanguinolento, violentíssimo, pervertidamente sensual, quase surreal em seu exagero, incluindo um final não apenas inusitado e surpreendente, mas que joga por terra toda a idéia que se fazia do filme até ali, mas também notável em inúmeros e incontáveis aspectos, configurando aquele tipo de obra onde se pode, entre outras coisas, testemunhar um verdadeiro mestre em exercício de sua arte. Ainda que uma arte carregada da mais desconcertante acidez e do mais irrestrito despudor.
Todas essas características somadas logo fizeram de “Morrer Ou Viver” uma espécie de cult, com direito a ainda mais duas continuações (que a bem da verdade não continuavam coisa alguma, mas essa, é uma outra história...).

Nenhum comentário:

Postar um comentário