sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Alucinações do Passado

Este filme, hoje visto como uma espécie de ‘clássico maldito’, pegou muita gente de surpresa especialmente aqueles que achavam que os trabalhos do diretor inglês Adrian Lyne se resumiriam a obras sobre os inúmeros desdobramentos do ato do adultério.
De repente, Lyne, com suas câmeras a registrar imagens escolhidas com perfeição, entregava um filme de terror, com um roteiro do à época celebrado Bruce Joel Rubin (que havia ganhado, em 1990, o Oscar da categoria por “Ghost-Do Outro Lado da Vida”) que abordava num único e exótico caldeirão, experiências militares, traumas da guerra do Vietnam, fantasmas e questionamentos metafísicos de ordem esotérica, que terminavam não se afastando muito da temática de seu mais famoso filme.
Seja de Bruce Joel Rubin, seja de Adrian Lyne, “Alucinações do Passado” é, de ambos, o melhor trabalho.
Jacob (um competente Tim Robbins) é, como percebemos na acachapante cena que dá início ao filme, um veterano da Guerra do Vietnam. Sonhos (ou lembranças) de sua experiência com a guerra lhe são recorrentes, em especial, um episódio ocorrido lá, cujos desdobramentos são nebulosos em sua memória. Atualmente, Jacob vive uma vida longe de ser a que ele tinha antes de ir para o campo de batalha: Se antes ele tinha esposa e filhos, agora ele trabalha como funcionário dos correios e vive com uma colega (Elisabeth Peña, surpreendentemente sensual). Um de seus filhos, o mais novo (interpretado pelo garotinho-sensação da época, Macaulay Culkin, de “Esqueceram de Mim”), morreu em um acidente, o quê causou seu afastamento da família. Ele sente que algo está errado, e os pesadelos constantes apenas comprovam isso. Aos poucos, aliás, esses transtornos começam a se passar em sua vida desperta, como na horripilante ocasião em que ficou preso numa estação abandonada do metrô –ou seria toda a realidade de Jacob, também ela, um pesadelo?
Sem as respostas, e passando a duvidar cada vez mais de sua sanidade, ele começa a testemunhar criaturas demoníacas tomando forma ao seu redor, nos momentos mais perplexos, e suspeita que tudo pode estar ligado à uma conspiração envolvendo um experimento químico no qual estariam incluídos o próprio Jacob e seus companheiros do Vietnam.
Ao assisti-lo, são perceptíveis os elementos que tornaram “Alucinações do Passado” uma obra memorável: Um clima soturno desigual, reforçado por reviravoltas radicais de roteiro que imprimem uma sensação de inquietação, emoldurado com primor pela fotografia de Jeffrey Kimbal que alterna enquadramentos estilisticamente panorâmicos com closes minuciosos; cenas concebidas com elevada noção de surrealismo tétrico –sendo a seqüência do hospital/hospício um dos momentos mais notáveis –e uma proposital oscilação de tom (lírico nas lembranças com o filho, árido nas cenas do Vietnam, sombrio nas cenas urbanas, predominantes no filme) imposta pelo diretor, que dá ao filme uma unidade narrativa tão absorvente quanto impactante.
Diante da excelência desta obra poderosa chega a ser quase desconcertante o fato de ele hoje ser tão desconhecido do público.

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