Em princípio, esta formidável série da Netflix parece guardar elementos das ficções científicas dos anos 1950 cujas narrativas se muniam de teorias da conspiração, cenários pós-apocalípticos, invasões alienígenas e muita paranóia, mas isso ocorre porque a história em quadrinhos aqui adaptada, escrita por Hector Oesterheld e desenhada por Francisco Solano López, de fato, É dos anos 1950 –publicada na Argentina, mais especificamente, entre 1957 e 1959 –e tida como a mais importante obra em quadrinhos daquele país.
Transposto para a atualidade, o enredo (cujas
alegorias em muito evocavam a repressão sofrida pela Argentina nos anos de
ditadura que perpassaram o Século XX) abandona alguns tópicos, lança mão de
novos personagens, compreende toda uma nova e urgente reflexão a ser realizada,
mas termina honrando, e muito bem, o espírito do trabalho de Oesterheld. No que
parece ser uma noite comum em Buenos Aires, os amigos Juan Salvo (Ricardo
Darín), Lucas (Marcelo Subiotto), Polsky (Claudio Martínez Bel) e Omar (Ariel
Staltari) se reúnem para jogar truco na casa de Alfredo Favalli (César
Troncoso, do cult “O Banheiro do
Papa”) quando são surpreendidos por um fenômeno inesperado: A um misterioso
pulso eletromagnético (que desabilita todas as máquinas de função elétrica no
país, talvez no continente inteiro!) segue-se uma nevasca poderosamente tóxica
(pessoas em contato com os flocos que caem do céu morrem instantaneamente!).
Por estarem fechados por acaso dentro da casa, Juan Salvo e seus amigos, mais
Ana (Andrea Pietra), esposa de Favalli, escapam de morrer como tantos que eles
testemunham perecer pelas janelas. Junta-se a eles a entregadora Inga (Orianna
Cárdenas) que, na última hora, conseguiu se refugir na garagem do mesmo prédio.
Contudo, Salvo possui uma filha adolescente,
Clara (Mora Fisz), cujos apuros são mostrados, em parte, no prólogo do primeiro
episódio, e uma ex-esposa, Elena (Clara Peterson). Temendo pela vida delas, ele
se equipa com o uniforme e a máscara que o isolam do perigo tóxico –e que tão
bem ilustram o visual memorável do personagem, seja na HQ, seja na série –e sai
a pé pela cidade na tentativa de encontrá-las (momentos onde a série faz
lembrar a maestria das cenas desoladoras vistas em “Eu Sou A Lenda”). Pelo
menos os primeiros três episódios se desdobram nesse objetivo, enquanto Salvo
vai encontrando pela frente outros núcleos de personagens sobreviventes às
voltas com as novas circunstâncias de um mundo cujo apocalypse virou as antigas percepções de pernas para o ar –não
mais podendo contar com a conveniência social, as pessoas organizam grupos
armados, dispostos a se proteger daqueles saqueadores que imediatamente adotam
a lei da selva.
Entre o terceiro e o quarto episódio, após
muitas idas e vindas (que vão consolidando Salvo, sua ex-esposa e os amigos
liderados por Favalli num grupo unido no objetivo de sobreviver), Salvo corre
atrás de uma pista do paradeiro de Clara que aponta para o centro populoso da
capital, onde ele e Favalli encontram um grupo reunido numa igreja
protegendo-se de outra grande ameaça: Caídos do céu, como meteoros, criaturas
de uma espécie de besouro gigante carnívoro vem vitimando os seres humanos que
escaparam com vida da nevasca tóxica. Os dois últimos e sensacionais episódios,
levam os personagens a partirem de seu refúgio até então seguro, quando são
surpreendidos pela súbita e inexplicada interrupção da nevasca, e acabam indo
parar no Campo de Maio, uma fortaleza erguida com recursos militares. Lá,
Favalli (por seu conhecimento como engenheiro elétrico) e Salvo (por sua
comprovada habilidade com armas de fogo, adquirida na juventude durante a
Guerra das Malvinas) são recrutados para uma audaciosa missão, invadir do
centro de Buenos Aires a bordo de um trem e enviar via rádio uma mensagem de
socorro pela torre principal –é quando os personagens se defrontam com novos
perigos e, talvez, com algumas respostas.
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