A premissa desta brilhante obra do diretor Ryan Coogler parece claramente beber da fonte de um cultuado filme de terror dos anos 1990, dirigido por Robert Rodrigues e roteirizado (e estrelado) por Quentin Tarantino –“Um Drink No Inferno”.
Como naquele filme há, em “Pecadores”, uma
dupla de irmãos (gêmeos, neste caso), cuja trajetória de crimes e mortes os
leva à noite fatídica que ocupa o cerne da narrativa; e como naquele filme, há
aqui também uma circunstância de cerco onde os protagonistas sobreviventes
devem enfrentar perigos impronunciáveis na forma de vampiros até o sol
amanhecer –perigos esses que representam um contraponto muito maior ao perigo
que eles mesmo representavam.
O ano é 1932. No estado da Louisiana, na
cidadezinha de Clarksdale, recém-livrada da Ku Klux Khan (ou, pelo menos, é o
que parece), os gêmeos Elijah e Elias Moore, também conhecidos por Smoke e
Stack (ambos interpretados, por meio de notáveis efeitos digitais de
duplicação, por Michael B. Jordan), retornam ao local onde cresceram dispostos
a fazer fortuna. Após um período em Chicago –onde aumentaram sua fama de
implacáveis para muito além dos crimes locais –os gêmeos agora têm dinheiro
para investir no sonho de um Clube de Blues, comprado de um proprietário ex-Ku
Klux Khan, e para o qual almejam trazer seus conhecidos mais próximos: O
comerciante chinês Bo Chow (Yao) e sua esposa Grace (Li Jun Li, de “Babilônia”)
para ajudar nos preparativos; a esposa de Smoke, Annie (Wunmi Mosaku, de
“Deadpool & Wolverine”), para contribuir com seu toque mágico na cozinha; o
grandalhão Cornbread (Omar Miller, de “8 Mile-Rua das Ilusões”) auxiliando na
segurança; e fornecendo a música aos frequentadores, o veterano e calejado
pianista Slim (Delroy Lindo, de “Regras da Vida”) e o primo deles, o
assombrosamente talentoso Sammie (Miles Caton); além das presenças das beldades
Pearline (Jayme Lawson, de “Batman”), como cantora, e Mary (Hailee Steinfeld),
como namorada de Stack.
Tal e qual (de novo) “Um Drink No Inferno”, a
trama de “Pecadores” se desdobra em uma única noite. Durante o seu breve
prólogo, uma narração em off nos
explica que existem pessoas cujo talento musical consegue evocar a música do
passado e do futuro, tal habilidade, é explicado também, desperta a atenção e o
interesse de alguns seres das trevas, capazes de perceber essa importância
sobrenatural.
É a música de Sammie (cujo alcance e a
influência através dos tempos são ilustrados numa cena absolutamente memorável)
que acaba atraindo as criaturas que, de um ponto em diante, darão um novo rumo
ao filme.
Ao contrário da obra de Rodrigues e Tarantino
–criticada, à época de seu lançamento, por trazer uma guinada tão abrupta para
o gênero de vampiros na metade de sua duração que praticamente contrastava com
a parte anterior do filme –este trabalho de Coogler nunca perde sua harmonia,
sua solidez ou sua coerência. Na maneira como justapõe os revezes raciais como
continuidade trivial de um horror ainda maior a espreitar nas sombras,
“Pecadores” se assemelha ao também excelente trabalho desempenhado na série
“Entrevista Com O Vampiro”, cuja primeira temporada também trazia essa mesma
postura alegórica.
Assim como tantas obras igualmente geniais a
ganhar a ribalta, o filme de Coogler se apropria de um difundido conceito de
terror para discutir temas sempre em voga, reflexões de ordem social e humana,
enquanto deixa sua própria marca dentro de um gênero popular e inesgotável.
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