sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Byzantium - Uma Vida Eterna

Pode ter sido a curiosidade em descobrir como seria trabalhar tal tema longe dos impedimentos e restrições protocolares de um grande estúdio, mas o fato é que o diretor irlandês Neil Jordan arriscou-se aqui a fazer um novo filme sobre vampiros, quase vinte anos depois de realizar o ótimo “Entrevista Com O Vampiro”, com Tom Cruise e grande elenco.
Esse novo filme, “Byzantium”, como todos os seus trabalhos, também ele produzido por Stephen Wooley, guarda fortes características de um projeto pessoal, dotado assim daquele intimismo e daquela melancolia normalmente evitados pelos filmes de inclinação comercial.
A verdade é que isso tem muito mais a cara de Neil Jordan: Trata-se de uma sondagem atenta às mais peculiares arestas, qual ele já fez no desconcertante “Traídos Pelo Desejo”, ou no magnífico “Fim de Caso”.
Jordan, enfim, pegou o tema dos vampiros e fez o quê “Entrevista...” (realizado sob rígida supervisão do estúdio da Warner, e impiedoso escrutínio da mídia, dos fãs e da autora, Anne Rice) não lhe permitiu fazer: Tornou-o seu.
Ainda que “Byzantiun” seja ele próprio uma adaptação, no caso do conto (também tornado uma peça de teatro) “A Vampire Story” de Moira Buffini.
Dessa forma, quando somos levados a acompanhar a trajetória de duas vampiras, mãe e filha, que se estende por dois séculos, encontramos diversos paralelos mais evidentes com as obras de Neil Jordan, e com sua visão muito pessoal e intrínseca das tendências que moldam o ser humano.
A intensa e atraente Claire (Gemma Arterton) vale-se de seu belo corpo para capturar, no papel de stripper ou mesmo de prostituta, os incautos infelizes que saciarão sua sede de sangue. Já sua filha, a introspectiva e puritana Eleanor (Saoirse Ronan) busca manter um código moral por meio do qual ela só suga o sangue (e, por conseqüência, extingue a vida) daqueles que já estão prontos para aceitar a morte –uma dicotomia entre duas personagens quase diametralmente opostas, mais complementares por um sentimento que as conecta, a exemplo de “Mona Lisa”.
Ao contrário do mito conhecido dos vampiros (que Jordan parece reinventar com a mesma convicção com a qual remodelou o conceito de lobisomens em “A Companhia dos Lobos”), o sol não lhes inflige dor ou destruição, nem tampouco elas possuem caninos salientes; ao invés disso, a unha de seus polegares cresce de forma proeminente no momento do ataque. A Irlanda, tão pessoal e especial para o trabalho de Jordan, é o palco por meio do qual as duas fogem das conseqüências dos atos mais terríveis que insistem em alcançá-las.
A estranha relação que as une, as razões pelas quais ambas fogem (e do quê exatamente fogem) através das suburbanas cidadezinhas da Irlanda, e como e por que cada uma converteu-se em vampira são questões que pouco a pouco a narrativa de Jordan vai tratar de esmiuçar, compondo os detalhes de uma história fatalista, trágica e cruel, onde o diretor joga particular atenção sobre os elementos sórdidos, e principalmente sobre a maneira tão instintiva e altiva com que cada uma das personagens lida com eles –numa dramaturgia que remete muito do seu início de carreira, com “À Procura do Destino”.
“Byzantium” é, portanto, uma tentativa com algo de nostálgica de Jordan em reencontrar a si mesmo, e ao cineasta que antes era, cujo idealismo e ímpeto de inocente criatividade, o hoje experiente Jordan parece apreciar ainda mais.
Encarregada da exuberante protagonista, a inglesa Gemma Arterton se sai muito bem, ostentando carisma e beleza acachapantes, embora vez ou outra aconteça de equivocar-se no tom correto da personagem, soando histriônica. A jovem Saoirse Ronan, porém, é impecável.
Curioso notar, ao falar do elenco, que este é o primeiro filme de Neil Jordan –até onde sei –que não conta com a presença de Stephen Rea, seu habitual ator-assinatura.

Nenhum comentário:

Postar um comentário