Volume 1
Desde o começo, os filmes de Quentin Tarantino
sempre tiveram por definição uma característica bastante referencial –obras
como “Pulp Fiction” comprovam isso –mas, foi a partir da saga “Kill Bill” que
ele deixou de lado uma certa preocupação em demonstrar uma postura mais séria e
abraçou definitivamente seu lado cinéfilo, harmonizando-o com o lado de
realizador: Isso porque, para ele, os filmes de artes marciais e os faroestes
spaghetti eram acalentados com mais carinho do que as obras intelectuais de
Michelangelo Antonioni, por exemplo (pode parecer uma comparação presunçosa,
mas até 2005 haviam críticos que apontavam sim Tarantino como o “novo
Antonioni”).
Foi com esta saga sobre vingança que Tarantino
passou a ser visto com um verniz muito mais pop e, por conseguinte, passou a
ter ainda mais influência no cinema hollywoodiano.
O plano de Tarantino era conceber um filme ágil
de artes marciais enquanto esperava as complicações envolvendo seu vindouro
épico sobre a Segunda Guerra Mundial se resolverem, como a complicada agenda
dos astros que ele almejava, Warren Beatty e Adam Sandler (mas, as coisas deram
errado e ele terminou realizando esse épico, “Bastardos Inglórios”, com Brad
Pitt e Eli Roth no lugar deles).
Até isso tudo ser solucionado, o filme ágil que
Tarantino planejava havia se tornado, ele próprio, num épico cujo roteiro
previa uma duração de três horas (!). A saída para manter um formato mais
enxuto foi dividir “Kill Bill” em dois volumes.
Assim sendo, o primeiro deles mostra "A Noiva"
(Uma Thurman, magnífica) acordando repentinamente de um coma de cinco anos.
Agora ela quer vingança contra aqueles que, no dia de seu casamento, mataram
seus convidados, e tentaram matá-la mesmo grávida, colocando-a assim naquele
leito de hospital. Ela elabora então uma lista contendo o nome desses
traidores, seus antigos colegas no grupo de assassinos de aluguel do qual fazia
parte (que incluem a ardilosa Daryl Hannah, Michael Madsen, Lucy Liu e Vivica
A. Fox), e por fim Bill (David Carradine, soberbo), seu ex-chefe e ex-amante.
Nenhum lugar do mundo onde estiverem será longe
demais para escapar da sua vingança.
E, deveras, o filme explode com elementos que,
até então, pareciam que jamais veríamos num filme de Quentin Tarantino, como
cenas insanas e alucinantes de lutas (cortesia da excelência da dublê Zoe Bell,
e do coreógrafo de lutas Yuen Woo Ping) e até mesmo um momento vibrante em que
o filme se transforma num anime japonês (quando a personagem de Lucy Liu é
apresentada), terminando num gancho perfeito, aflitivo e empolgante para a
retomada da trama, no segundo filme.
Volume 2
A história acerca dessa divisão, por sinal, foi
muito alardeada na campanha de marketing de “Kill Bill”, cujo intervalo de
tempo entre o lançamento das duas produções foi mais ou menos uns dez meses.
Passando a impressão de que eram um filme só
dividido em dois.
Todavia, até hoje é assunto de discussão e
teoria se essa divisão já não fazia parte dos planos de Tarantino desde o
começo, visto que ambos os volumes são óbvia, visível e pensadamente dois
filmes completamente diferentes.
Se o volume 1 era um filme de ação, e como tal
ostentava uma exuberância visual em detrimento de uma carpintaria dramática
mais complexa, o volume 2, pouco a pouco, seguia em sentido inverso: Desconstruindo
a ordem subconsciente das expectativas que a própria trama provocava, Tarantino
(re)introduziu uma série de elementos que tratavam de humanizar os mesmos
personagens que surgiam quase cartunescos e caricatos no volume 1 (deixando explícita a forte influência que o clássico japonês "Lady Snowblood" teve sobre o trabalho de Tarantino), mas que no
volume 2 adquiriam dimensão trágica, propósitos e insuspeita autenticidade.
Isso amplia ainda mais a natureza do filme que,
mesmo assim, não deixa de lado a sinergia desigual das cenas de luta; elas
apenas deixam de ser o foco principal em prol dos elementos que realmente
importam à narrativa.
A lista já está na metade. Quando reencontramos
a "Noiva" (não apenas seu verdadeiro nome é revelado neste volume,
como também a sua motivação), ela está prestes a completar a sua vingança. Faltam,
entretanto, alguns dos nomes mais difíceis de serem eliminados. Os percalços de
sua vingança a farão recordar suas duras lições de aprendizado das artes
marciais, com seu antigo mestre (uma sucessão memorável e divertida de cenas) e explicarão melhor o seu comportamento e o de
outros personagens.
Ao final de tudo, estará
Bill aguardando-a pacientemente com uma revelação surpreendente.
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