O sexo sempre fez parte intrínseca das
inquietações que moviam o ímpeto criativo do diretor holandês Paul Verhoeven.
Obras como “Louca Paixão”, “O Amante de Kathy Typel” ou “O Quarto Homem” tinham
por definição e princípio a maneira com que se debruçavam, sem pudores, a
analisar as reações sexuais de seus personagens.
Tal postura, que chocava –e, provavelmente,
enchia de admiração –os americanos, na verdade, refletia muito da mentalidade
cultural de seu país, acrescido por um arrojo de sofisticação e uma
predisposição para o atrevimento que era todo próprio de Verhoeven.
Era natural que, quando ele migrasse para
Hollywood, ele levasse tal característica consigo.
E foi o quê ele fez! Ainda que no início,
houvesse uma abordagem indireta, velada até, desses elementos: Trabalhos como
“Robocop” e “O Vingador do Futuro”, no que diz respeito ao conteúdo sexual,
estavam mais no terreno da sugestão que do fato –embora, seu magnífico
“Conquista Sangrenta”, realizado de forma mais independente, tenha um erotismo
todo acentuado.
Foi só com esta trama policial, escrita pelo
roteirista Joe Ezsterhas –que, como Verhoeven, tinha lá suas obsessões com
nudez e sexo! –que o “holandês maluco” pôde, por assim dizer, tirar suas garras
de fora no cinemão hollywoodiano.
Já fica bem claro que não há nenhum traço de
bom-mocismo no policial corrupto interpretado por Michael Douglas –e nessa
manobra o filme irmana-se à todo o gênero noir, que comparece com inúmeros
atributos e referências neste trabalho. Ele vê-se perplexo quando, ao
investigar um hediondo assassinato com requintes sexuais, conhece uma das
principais suspeitas: Catherine Trammell (Sharon Stone, absolutamente perfeita
no papel que é o grande divisor de águas de sua carreira), uma extremamente
sexy escritora de romances, que lhe abala as estruturas, nos mais
diversificados sentidos.
Não demora a ficar claro que –seja ela culpada
ou não do crime em questão –Catherine não é “flor que se cheire”; a seqüência
de interrogatório dela pelos perplexos policiais –na qual Verhoeven obtém uma
fortuita, reveladora e desconcertante tomada de suas partes íntimas! –deixa
bastante evidente o poder até mesmo opressor que essa femme fatale exerce sobre
os homens, incluindo o personagem de Douglas.
Ainda assim, sendo absurdamente atraente e
linda, Catherine o seduz e faz dele seu amante –em uma cena de sexo que é
indicativa não só do apelo sexual poderosíssimo que a atriz possui, como também
do tarimbado traquejo técnico e artístico que o diretor tem para esse tipo de
seqüência –para então mergulhá-lo num universo de libertinagem e masoquismo,
que pode esconder uma série de pérfidos segredos.
Um dos mais marcantes filmes dos anos 1990, não
apenas por seu largo êxito de público e crítica, mas porque também revelou o
vulcânico símbolo sexual Sharon Stone (ela protagoniza cenas de nudez e sexo
que são até hoje referências entre as produções mais erotizadas), “Instinto
Selvagem” é acima de tudo um suspense eficiente e uma amostra muito mais
peculiar e referencial do grande artesão que Paul Verhoeven é, do que o foi
seus anteriores “Robocop” e “O Vingador do Futuro”.
Nos anos seguintes, seu cinema foi prejudicado
por obras que pendiam com exagero para essas tendências à perversão que em
muito o definem (sim, eu me refiro à “Showgirls”), e durante algum tempo, nem
tentativas de retomar um cinema mais comercial –como “Tropas Estelares” ou “O
Homem Sem Sombra” –foram capazes de trazê-lo à ribalta.
Pode-se afirmar então que
“Instinto Selvagem” foi, até aqui, o momento mais brilhante de sua carreira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário