“Olhe, mas não toque. Toque, mas não prove.
Prove, mas não engula.”
É deliciosamente sarcástica a forma como o
diabo, interpretado enfaticamente por Al Pacino, ironiza e desdenha as supostas
regras criadas por Deus e impostas ao homem.
Essa auto-consciência divertida presente em sua
caricata interpretação –a despeito da seriedade ostentada por todos os outros
atores –é o salva-vidas ao qual o expectador deve se agarrar no objetivo de
melhor aproveitar o interessante filme do diretor Taylor Hackford, um misto
quase conceitual, ainda que cheio de charme e elementos interessantes, de “O
Bebê de Rosemary” com “Wall Street-Poder e Cobiça”.
Da obra de Polanski, o diretor extrai o equilíbrio
curioso obtido da junção entre um clima francamente tétrico de filme de terror
com um senso de humor perverso, inerente à narrativa. Da obra de Oliver Stone,
ele tira sua ambientação (ainda que estejamos falando, aqui, de advocacia e não
de executivos empresariais), com homens de terno para todos os lados; tira também
a percepção de luxo e requinte que seduz os incautos e, sobretudo, a figura
soberana e incontornavelmente corruptível elevada às raias literais da
perniciosidade.
Há, nele também uma característica com a qual muitos
filmes comerciais dos anos 1990 trabalhavam seu apelo popular: A união, em
cena, de um ator consagrado com um jovem astro promissor.
O jovem promissor em questão é Keanu Reeves (recém-saído
do sucesso “Velocidade Máxima”, mas ainda alguns anos antes de “Matrix”) cujo
registro titubeante e engajado da perplexidade ajuda na composição de seu
personagem, um advogado ambicioso contratado por importante firma
nova-iorquina, após inocentar, contra todas as previsões, um réu acusado de
pedofilia.
O chefe de tal firma (Pacino, que une graça e
supremacia numa quase paródia do Gordon Gekko de Michael Douglas em “Wall
Street”), poderosíssimo e cheio de segundas intenções, acompanha atenciosamente
a ascensão de seu novo advogado que, ingênuo, ignora o fato de estar trabalhando
para o capeta em pessoa.
Esse misto curioso de terror e filme de
advocacia, que felizmente parece jamais se levar a sério, guarda ainda
vestígios pertinentes da visão cristã do diretor Hackford sobre as pulsões
humanas e seus sete pecados capitais transfigurados em cenas particulares: Há
sobretudo a cobiça (quando o protagonista negligencia a própria esposa –uma jovem
Charlize Theron, linda, frágil e angelical –em prol de um caso), a luxuria
(materalizada especialmente nas curvas de uma espetacularmente sexy Connie
Nielsen –que tem até cenas de nudez!), a vaidade (representada pelo golpe final
do capeta, na última e emblemática cena), a ira (uma enérgica participação do
sumido Graig Nelson, que fez “Poltergeist-O Fenômeno”, no papel de um cliente
nem um pouco inocente) e outros.
Talvez o produtor, Arnold
Coppelson não estivesse totalmente livre dessa obsessão tendo ele produzido a
obra-prima “Seven-Os Sete Crimes Capitais” alguns anos antes para o diretor
David Fincher.
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