quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Jovens, Loucos e Mais Rebeldes

Eis que o projeto seguinte do diretor Richard Linklater, após sua consagração (e indicações ao Oscar) de seu filme “Boyhood” (aquele que se passa ao longo de 12 anos) veio a ser justamente uma espécie de ‘continuação espiritual’ de um de seus trabalhos de início de carreira, o sensacional “Jovens, Loucos e Rebeldes”, que relatava com emoção, graça e saudosismo os últimos dias de uma turma de jovens dos anos 1970 prestes a se formar.
Já se achavam ali todas as características que definiriam o cinema de Linklater: O registro humano e humanista dos anseios da juventude, com um particular interesse na geração da década de 1970; a construção narrativa amparada, em grande parte, na espontaneidade e no improviso de seu elenco jovem; e uma mescla bastante homogênea de comédia e drama, carregada na sutileza e no intimismo.
Por sua vez, este “Jovens, Loucos e Mais Rebeldes”, desta vez situado no início dos anos 1980, não se preocupa em estabelecer qualquer relação com aquele outro filme –não possui personagens em comum, não lhe faz qualquer referência em sua trama, e nem dá continuidade a qualquer desenlace lá ocorrido.
A tênue relação que se pode estabelecer (e que aqui no Brasil só foi mais explicitada porque o título nacional é uma referência desavergonhada!) é que ambos lançam um olhar íntimo e descontraído sobre situações assimetricamente similares: Se o filme anterior era sobre um encerramento –e paradoxalmente, o início de uma nova fase –este novo trabalho aborda justamente um recomeço, acompanhado da sensação agridoce de tudo o quê ficou para trás; São os três dias que o jovem Jake (Blake Jenner) tem para se aclimatar aos novos amigos e à nova moradia antes que as aulas na universidade comecem. Como é um jogador de beisebol, ele obteve uma bolsa, e graças a ela vai morar numa casa do campus com outros bolsistas. Todos eles são jovens e estão na expectativa de conquistar mulheres, beber e se divertir. Mas –como toca a muitos trabalhos do diretor –esse verniz de bagunça inconseqüente logo começa a desvanecer a medida que a narrativa vai esmiuçando as particularidades de cada um, seja em seu humor, seja em seu drama: O filosófico Finnegan (Glen Powell), o competitivo McReynolds (Tyler Hoechlin), o boa-praça Willoughby (Wyatt Russell), o irrequieto Nesbit (Austin Amélio) e muitos outros.
Como bom diretor que é, Linklater sabe acarinhar seus personagens, e na condução segura e inteligente que dá ao elenco (numeroso e inspirado) leva o expectador a nutrir carinho por eles também. Sua hábil capacidade de construir cenas e à elas dar um ritmo adequado contorna até mesmo o fato –complicado para outros diretores –de que não há um grande conflito em jogo durante todo o filme.
Já era uma característica proposital (e das mais notáveis) em seu consagrado “Boyhood” –e, por que não, no “Jovens, Loucos e Rebeldes” original –enfatizar os momentos de transição, sem necessariamente embuti-los com revezes maniqueístas, mas sublinhar com talento e brilhantismo as arestas universais da experiência humana.

A lamentar apenas que este filme maravilhoso (tão sensacional quanto todos os outros que ele fez) não tenha recebido qualquer atenção para seu lançamento, surgindo quase que despercebido. Não parece que é o trabalho subseqüente de um diretor indicado ao Oscar, e nem que é uma obra tão prazerosa e bela quanto seu filme mais famoso.

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