Este filme do diretor Jia Zhang-Ke trás uma das
mais longas cold open que já vi em um filme até hoje: Ela dura incríveis
quarenta e cinco minutos!
O capitalismo trazendo uma ocidentalização e
uma conseqüente desigualdade ao modo de viver da China é, talvez, o grande mote
de “As Montanhas Se Separam”, embora seu diretor, Zhang-Ke, pareça muito
interessado nas particularidades emocionais de seus personagens, e na composição
sempre elaborada que ele entrega das imagens. E tudo isso (ou melhor, a junção
enquanto filme de tudo isso) o interessa de fato –eis aí, então, um cineasta
completo.
E não há maneira mais contundente de mostrar
desigualdade do que por meio de um triângulo amoroso: O simples e humilde
Liangzi (Jing Dong Liang) e o proeminente, arrogante e ambicioso Jinsheng (Yi
Zhang) amam a mesma mulher, a encantadora e contagiante Tao (Tao Zhao, esposa
do diretor) que, durante algum tempo não consegue decidir-se por um dos dois.
Até que isso aconteça, Jinsheng compra a mina de carvão onde Liangzi trabalha e
o despede.
Registrados em um perceptível vídeo granulado,
esses acontecimentos transcorrem no ano de 1999, com os personagens
transbordando alegria e vontade de viver (em especial, Tao), e uma expectativa
positiva em relação ao futuro, embora a narrativa vá transfigurando essas
percepções sugerindo, através delas, a transformação das coisas no fluxo da
vida.
Ele assume que relações a dois dificilmente conseguem durar.
É por isso que, já em 2014, os desdobramentos
da trama já trataram de tornar tudo diferente –e essa diferença é reforçada
pelo registro de Zhang-Ke, cuja câmera apresenta um formato de tela de aspecto
distinto em cada mudança de época do filme.
Neste segundo segmento a tela aparece mais
aberta (a granulação de imagem dos anos 1990 é substituída por uma clareza
translúcida mais atual), porém ainda confinada num formato letterbox,
refletindo os empecilhos do passado que ainda assombram os reencontros, em
geral dolorosos e sofridos, onde Liangzi irá rever Tao, assim como esta vai rever
–após a perda de um ente querido –seu filho.
O mesmo garoto, chamado Dollar, com vinte anos
de idade, é o protagonista do terceiro e mais inesperado segmento, ambientado
no futuro, em 2025 –e, por isso mesmo, mostrado numa tela aberta de widescreen,
abundante em panorâmicas, e repleto de pequenos detalhes acerca da tecnologia
futurista (como uma mescla indefinível de celulares e computadores com tela
fina de vidro) –está na Austrália, onde ele, agora falando em inglês (e esse
idioma aparenta ser desconfortável para o elenco), envolve-se com uma
professora enquanto ensaia tentativas infrutíferas de reencontrar a mãe, Tao,
cuja última vez que viu foi naquele fortuito episódio de 2014.
Jian Zhang-Ke reflete assim
as angústias de sua terra numa trama que avalia o passado, o presente e o
futuro, com um olhar agridoce nas possibilidades que não se concretizaram. Uma
incerteza que paira sobre todo o filme e o mantém memorável ao expectador após
seu final.
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