quinta-feira, 6 de abril de 2017

As Montanhas Se Separam

Este filme do diretor Jia Zhang-Ke trás uma das mais longas cold open que já vi em um filme até hoje: Ela dura incríveis quarenta e cinco minutos!
O capitalismo trazendo uma ocidentalização e uma conseqüente desigualdade ao modo de viver da China é, talvez, o grande mote de “As Montanhas Se Separam”, embora seu diretor, Zhang-Ke, pareça muito interessado nas particularidades emocionais de seus personagens, e na composição sempre elaborada que ele entrega das imagens. E tudo isso (ou melhor, a junção enquanto filme de tudo isso) o interessa de fato –eis aí, então, um cineasta completo.
E não há maneira mais contundente de mostrar desigualdade do que por meio de um triângulo amoroso: O simples e humilde Liangzi (Jing Dong Liang) e o proeminente, arrogante e ambicioso Jinsheng (Yi Zhang) amam a mesma mulher, a encantadora e contagiante Tao (Tao Zhao, esposa do diretor) que, durante algum tempo não consegue decidir-se por um dos dois. Até que isso aconteça, Jinsheng compra a mina de carvão onde Liangzi trabalha e o despede.
Registrados em um perceptível vídeo granulado, esses acontecimentos transcorrem no ano de 1999, com os personagens transbordando alegria e vontade de viver (em especial, Tao), e uma expectativa positiva em relação ao futuro, embora a narrativa vá transfigurando essas percepções sugerindo, através delas, a transformação das coisas no fluxo da vida.
Ele assume que relações a dois dificilmente conseguem durar.
É por isso que, já em 2014, os desdobramentos da trama já trataram de tornar tudo diferente –e essa diferença é reforçada pelo registro de Zhang-Ke, cuja câmera apresenta um formato de tela de aspecto distinto em cada mudança de época do filme.
Neste segundo segmento a tela aparece mais aberta (a granulação de imagem dos anos 1990 é substituída por uma clareza translúcida mais atual), porém ainda confinada num formato letterbox, refletindo os empecilhos do passado que ainda assombram os reencontros, em geral dolorosos e sofridos, onde Liangzi irá rever Tao, assim como esta vai rever –após a perda de um ente querido –seu filho.
O mesmo garoto, chamado Dollar, com vinte anos de idade, é o protagonista do terceiro e mais inesperado segmento, ambientado no futuro, em 2025 –e, por isso mesmo, mostrado numa tela aberta de widescreen, abundante em panorâmicas, e repleto de pequenos detalhes acerca da tecnologia futurista (como uma mescla indefinível de celulares e computadores com tela fina de vidro) –está na Austrália, onde ele, agora falando em inglês (e esse idioma aparenta ser desconfortável para o elenco), envolve-se com uma professora enquanto ensaia tentativas infrutíferas de reencontrar a mãe, Tao, cuja última vez que viu foi naquele fortuito episódio de 2014.
Jian Zhang-Ke reflete assim as angústias de sua terra numa trama que avalia o passado, o presente e o futuro, com um olhar agridoce nas possibilidades que não se concretizaram. Uma incerteza que paira sobre todo o filme e o mantém memorável ao expectador após seu final.

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