Apenas um ano separa esta obra do filme
anterior de Argento, “O Pássaro das Plumas de Cristal”, também ele integrante
da chamada Trilogia dos Bichos, mas o salto de convicção e aperfeiçoamento do
próprio estilo que Argento experimentou aqui fazem parecer ter sido muito mais
tempo.
“O Gato...” faz “O Pássaro...” parecer um
ensaio básico para o que depois viria (embora o próprio Argento não tenha
ficado satisfeito com o resultado). Nesta nova trama, Argento torna ainda mais
explícita a sua obsessão para com a condição do voyeur (como num prolongamento
mundano de Alfred Hitchcock) e para a reflexão desse estado ao eleger como
protagonista um ex-jornalista cego (Karl Malden em ótimo desempenho)
transformado pelas circunstâncias numa improvável testemunha de um crime que
pode levar as investigações de um jovem jornalista (James Franciscus) à
descoberta revolucionária e desconcertante de uma clínica especializada em genética
de ponta, abarrotada, por sua vez, de cientistas e outros personagens de
atitudes muito suspeitas.
Embora carregado de elementos detalhados e
mirabolantes a pontuar os propósitos de sua trama, é sabido que Argento
negligenciava deliberadamente o roteiro e sua lógica em prol da construção do
estilo e do impacto planejado para as cenas.
Em “O Gato de Nove Caudas” esse choque se dá
ainda em contraponto ao fato de um dos protagonistas ser cego: Desprovido,
portanto, da capacidade do olhar, o quê para Argento, abre curiosas
possibilidades na sua reflexão dos acontecimentos –o personagem de Karl Malden
vale-se de táticas mais variadas para a análise dos assassinatos de Argento, dando
oportunidade do diretor exercer sua observação compulsiva do ato de matar sobre
alternativas ainda mais diferenciadas e radicais –o som diegético; a lembrança
num corte abrupto da edição; a conclusão de algo que está no pensamento, mas
ainda não se viu materializado na realidade.
A fim de ocultar a
identidade de seu assassino o máximo de tempo possível, Argento lança mão de um
uso audacioso e provocativo de câmera subjetiva, enfatizando ainda mais sua
intenção para a construção de um cinema cujas imagens respondem por si mesmas.
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