Quando do lançamento deste trabalho, já havia
mais ou menos o que se esperar de Lars Von Trier: Um trabalho audaz e
inclemente sobre as nuances mais obscuras, cruéis e fisiologicamente primitivas
do ser humano.
Ele conta que escreveu o roteiro de
“Anti-Cristo” tomado de profunda depressão –e que, por isso, o resultado
poderia não estar à altura de sua capacidade –e que sua história gira em torno
da insistência dos psiquiatras (contestada por ele, de modo geral) de que
pessoas com ansiedade não são perigosas.
Contado em blocos bem determinados –como a
maioria de seus trabalhos –o filme é um dos poucos no qual VonTrier se atreve a
adentrar um gênero específico em todas as suas definições: No caso, o terror.
Seu início é tão aterrador quanto sublime:
Enquanto pratica sexo no chuveiro (e Von Trier não perde a oportunidade de
introduzir aqui cenas de sexo explícito!), um casal negligencia o filho pequeno
que acaba despencando da janela do apartamento. Em preto e branco e ao som da
inebriante “Lascia Ch’io Pianga”, esse prólogo eleva consideravelmente o filme
de Von Trier.
Como costuma acontecer em seus filmes, porém, o
diretor deliberadamente arremessa seus personagens e o público numa espiral de
sadismo, degradação, violência física e psicológica e martírio auto-infligido
que não demora a tornar seu filme insuportável: O casal do início (Willen Dafoe
e a atriz regular de Von Trier, Charlotte Gainsbourgh) decidem então se retirar
para uma isolada casa de campo, onde o marido, que à propósito, é psicólogo,
acredita poder submeter sua esposa à um eficaz tratamento que lhe amenize a dor
da perda.
Como todos os personagens munidos de boas
intenções nas tramas de Von Trier, o de Willen Dafoe experimentará o inferno na
forma da dor física que os surtos de insanidade de sua esposa deflagrarão –e,
nesse aspecto, Charlotte dá quase um show à parte.
O auge de flagelo visual a
que Von Trier é capaz de chegar –talvez, em perspectiva de sua filmografia toda
–é a cena perturbadora de mutilação vaginal (!), mas, para além disso, “Anti-Cristo”
vem pontuado por simbolismos de ordem intelectual, plenos de erudição, que
deixariam Tarkovski orgulhoso, e as platéias em gerais, no entanto, atônitas.
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