O diretor Robert Zemeckis parece se esbaldar
com a possibilidade de emular uma narrativa à moda antiga, a homenagear neste trabalho
o profundamente merecedor de homenagem, “Casablanca”. Uma vibração clássica, de
um fascínio pelo charme emanado dos filmes de antigamente (a despeito do apreço
que ele sempre demonstrou por tecnologia de ponta), se percebe em muitas das
suas obras, mas somente aqui ele pode recriar uma produção realmente naqueles
moldes.
“Aliados” expressa um carinho imenso, além de
uma forte vontade de irmanar-se aos filmes de espionagem dos anos 1940 e 50,
onde a Segunda Guerra Mundial proporcionava uma narrativa despida de ambigüidades,
justapondo mocinhos e vilões de forma genuína, embalada na envolvente roupagem
de romantismo e espionagem aventuresca –é todo um cinema assim que Zemeckis
resgata com a história dos espiões Max e Marianne.
Ele (Brad Pitt, em adequada composição de época,
fazendo lembrar alguns astros do passado), um oficial canadense à serviço da
contra-inteligência britânica. Ela (Marion Cottilard, com sua beleza acachapante
e seu talento afiado), uma espiã francesa cuja competência e eficiência em missões
de campo já lhe renderam relativa fama.
Os dois se conhecem durante uma arriscada
missão para eliminar um membro da alta cúpula nazista, quando se disfarçam como
um casal apaixonado. Contra todos os indicativos e recomendações –e num
desenlace tão inevitável quanto incontornável, tendo em cena os atrativos
hiperlativos de Brad Pitt e Marion Cottilard –eles se apaixonam e, após
terminada a missão, quando cada um deveria seguir um caminho e nunca mais ouvir
falar um do outro, eles resolvem se casar.
A felicidade dura um ano –tempo de sobra para o
nascimento de uma filha e o estabelecimento de uma agradável vida doméstica –até
que os superiores de Max identificam indícios que apontam Marianne como uma
possível espiã trabalhando para os alemães.
É a dúvida em torno da possível culpa de
Marianne (sustentada por uma atuação preciosa e minimalista de Marion) que irá
alimentar grande parte da narrativa de suspense que Zemeckis conduzirá daí até
o final.
Nem parece o mesmo Robert Zemeckis que, em
meados da década passada, recebeu críticas por seu cinema deixar de lado o
elemento humano para se concentrar em avanços digitais (devido à irregularidade
de obras como “O Expresso Polar”, “A Lenda de Beowulf” e “Os Fantasmas de
Scrooge”): É no carisma de Brad Pitt e na competência de Marion Cotillard que
todo o filme, apesar do ocasional virtuosismo do diretor em uma ou outra cena,
se ampara, construindo sua atmosfera de suspense (que em muito também deve aos
trabalhos de Hitchcock) em torno da prorrogação contínua da aflição sem
resposta dele (seria a esposa uma espiã?) e da presença charmosa e intoxicante
dela (estaria a personagem de Marion, em sua beleza desestabilizadora e sua
promessa de amor genuíno, ocultando uma femme fatale?).
Como num bom thriller de espionagem de
antigamente, o diretor Zemeckis compreende quais são as molas que fornecem o
empuxo para as ações e motivações de seus personagens e manipula esses
elementos com grande serenidade e perspicácia.
Seu trabalho acaba sendo
quase reverencial tamanho é o apreço pelo tipo de cinema que emula, mas se não é
sua técnica capaz de tornar o filme memorável, ele tem ao menos um casal
central que cataliza as atenções do público.
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