Último trabalho do diretor Sam Peckinpah, que
veio a falecer um ano depois de sua realização, este “O Casal Osterman” reúne
inúmeras incoerências que o impedem de estar entre as grandes obras do diretor,
entretanto, certamente ainda trás os elementos que o engrandeciam, dispostos em
uma trama que nem sempre obedece à lógica para se fazer avançar.
Para começar, o título nacional é absolutamente
equivocado: Não há um “casal Osterman” na trama, uma vez que o personagem
Bernie Osterman (vivido por Craig T. Nelson, de “Poltergeist-O Fenômeno”) é
exatamente o único solteiro! A tradução para “The Osterman Weekend” seria algo
como “O Fim-de-Semana Osterman”, mas não sei porque o filme levou esse título.
Enfim, soa bastante promissora a idéia de ver
Peckinpah narrar ao seu estilo peculiar e brutal uma trama de espionagem, nem
sempre, porém, as conspirações –inevitáveis nesse gênero –se justificam com
plausibilidade, fazendo as motivações de alguns personagens ficarem muito
confusas.
Tomemos, por exemplo, o agente Fasset interpretado
pelo sempre excelente John Hurt. Na cena que abre o filme –e que, sob o ponto
de vista granulado de uma câmera de espionagem já deixa claro o viés voyeurístico
que Peckinpah impõe à narrativa –onde vemos ele e sua linda esposa fazerem
sexo, descobrimos que, na seqüência, ela é assassinada por agentes da KGB, numa
seqüência que será reiterada sistematicamente ao longo do filme, mais ou menos
como a cena do áudio captado numa praça de “A Conversação”, de Francis Ford
Coppola.
Presume-se que a morte da esposa seja,
portanto, o ímpeto que leva Fasset a coagir um cidadão americano, o
apresentador de TV John Tanner (Rutger Hauer) e sua mulher Ali (Kristie Alley,
que anos depois faria sucesso com “Olha Quem Está Falando!”), a deixarem que
seus três amigos –Bernie, Joe (Chris Sarandon, o vampiro de “A Hora do Espanto”)
e Richard (Dennis Hopper), assim como as esposas dos dois últimos –sejam
espionados em sua casa onde passarão o fim de semana.
Ele tem o aval do chefe maior da CIA, o
poderoso Maxwell Danforth (Burt Lancaster, sensacional).
Segundo Fasset, os três amigos de Tanner
estariam envolvidos com uma conspiração relacionada à KGB –e com a Guerra Fria,
os russos ainda eram os vilões prediletos dos americanos nos anos 1980 –em um
grupo denominado “Ômega”. Todavia, a tensão resultante daqueles dois dias leva
a uma situação de cerco na qual o diretor Peckinpah pode, enfim, lançar mão de
sua experiência em saborear os atritos violentos ocasionados pela ação, além de
demonstrar, neste seu filme derradeiro, um apetite inesperado por flagrantes de
intimidade: As cenas de nudez das atrizes parecem atender a um comentário específico
do diretor em torno do olhar intrusivo inerente ao ato da espionagem.
Nesse ponto, quando o enredo ganha uma espécie
de guinada, e o filme revela que providencialmente nada é aquilo que parece, as
justificativas que Peckinpah encontrou na trama para levar às cenas de embate,
de perseguição ou de tensão soam destituídas de propósitos e, não raro,
contraditórias com sua primeira parte.
Fasset, o personagem de John Hurt, sobretudo, é
um caso grave! É bastante complicado entender quem ele hostiliza e porquê, já
que chega um ponto em que a vingança arquitetada por ele contra os supostos
coniventes que a morte de sua esposa parece muito pouco razoável.
A despeito dessas falhas tremendas e incômodas
de roteiro, o diretor Peckinpah deixa bem claro que elas não são mais do que
pretextos para levar aos momentos que o interessam de fato, como o já
mencionado cerco noturno à casa de Tanner (e que lembra muito o cerco à mansão
visto em “Sob O Domínio do Medo”), ou o tiroteio à beira da piscina (com a
memorável cena em que Kristie Alley alveja os algozes de seu marido com um arco
e flecha) e a tensa e dúbia seqüência final, onde Peckinpah alterna a montagem
frenética com uma entrevista de Danforth, a tentativa de fuga de Fasset e a
execução do plano final não revelado de Tanner e Osterman.
Um bom encerramento para
uma carreira que entregou títulos infinitamente mais antológicos.
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