Para além da forma indissociável que esta
personagem histórica imbricou na cultura pop como uma espécie de representante
do protagonismo feminino (cujas referências se encontram em trabalhos como
“Jogos Vorazes”), esta estilizada versão é transparente, sobretudo, no modo
como reflete as aspirações de seu realizador, o francês Luc Besson.
Terceiro projeto de Besson após sua mudança
para os EUA na década de 1990 –os anteriores foram o notável “O Profissional” e
o mirabolante “O Quinto Elemento”, no qual conheceu a atriz Milla Jovovich que
aqui nomeou protagonista –a produção parece reunir um conceito bastante
norte-americano e corporativo: É, deveras, de uma conveniência muito
mercadológica à Hollywood juntar em um único projeto de ares grandiloquentes um
realizador francês notório por seus filmes de ação e uma personalidade
histórica da França num épico (repleto de cenas de ação, veja só!) com o aval
do cinemão norte-americano.
Os executivos, talvez, só não pararam para
enxergar o quanto este projeto poderia destoar da própria postura de Besson
como autor –e, de repente, nem ele próprio!
De fato, a direção de Besson soa ligeiramente
oprimida aqui, embora ele ainda consiga fazer o que é inerente em todos os seus
filmes: Levar um senso de observação íntima que dialoga espirituosamente com
sua afinada percepção de espetáculo.
Difícil dizer, na conclusão final a que leva o
filme, se essa observação pertence mais à Besson ou ao estúdio que o financiou.
Comprovando toda a desenvoltura para cenas de
ação que ela já havia demonstrado em “O Quinto Elemento” (e que levou-a a
estrelar a infame franquia “Resident Evil”), Milla Jovovich surge, num registro
bastante desigual, como Joana, uma inocente garota camponesa dos interiores da
França que testemunha a barbárie dos invasores perpetrada contra sua aldeia e
sua família.
Anos mais tarde, já adolescente, e com a França
ainda em convulsão devida à sua instabilidade política e religiosa, Joana
torna-se uma guerreira afirmando que seus passos são na verdade dados a partir
de desígnios fornecidos por entidades celestiais que se comunicam com ela.
No terço final, ela é feita prisioneira pelos
ingleses e submetida a um julgamento cujo teor inquisitivo e meticuloso visa
sabotar sua fé; entretanto, a própria Joana será, ela mesma, confrontada com os
questionamentos de seus fantasmas.
No esforço de tentar ser mais
do que um outro filme a tentar levar novo enfoque á célebre história de Joana
D'Arc (fato que o torna passível de comparação com uma infinidade de obras que
vão desde o clássico mudo “A Paixão de Joana D’ Arc”, de Carl Theodor Dreyer,
até o filme homônimo de Victor Fleming, estrelado por Ingrid Bergman, só para
citar os mais ilustres), este trabalho converge seus detalhes no fato de que,
desta vez, a história é contada por um esteta cultuado e munida de todos os
recursos tecnológicos à disposição de uma produção hollywoodiana. Não obstante
o fato de, por isso mesmo, Besson revelar-se aqui mais convencional que de
costume, a maior diferenciação deste projeto é a abordagem curiosa que o filme
parece fazer das motivações de sua personagem principal: Na atuação definida
pelo olhar maníaco de Milla Jovovich e, em especial, na condução questionadora
de ordem fantasiosa que ele dá à meio hora final (onde a alardeada participação
do grande Dustin Hoffman se concretiza), o filme de Besson parece fazer algo
que os que vieram antes dele não se atreveram (ou não tiveram o mau gosto de
tentar...), ele confronta Joana D’ Arc com a possibilidade de sua própria
loucura.
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