Após dirigir uma série de filmes magistrais
(dos quais muitos não tiveram ainda o devido reconhecimento do grande público)
como os ótimos “32 de Agosto Na Terra”, “Redemoinho”, “Polytechnique”,
“Incêndios” e "Os Suspeitos", o canadense Denis Villeneuve enveredou
pela concepção de um filme que se encaixa muito bem no perfil de sua personalíssima
filmografia: “O Homem Duplicado” é uma espécie de filme-enigma, fadado a se
tornar um objeto de estudo (senão até mesmo de culto) por muitos de seus
expectadores.
Tudo começa com Anthonie (o arrojado Jake
Gyllenhall), um professor de história tão pacato quanto passivo. Sua rotina
resume-se rigorosamente em dar aulas, ir para casa, transar com a namorada,
Mary (a francesa Melanie Laurent, sempre linda), e recomeçar tudo de novo no
outro dia.
Em um momento banal de laser doméstico, ele
descobre, num filme, alguém exatamente igual a ele. Conhecê-lo acaba
tornando-se então uma obsessão. Esse alguém, mais tarde, ele descobre, é Adam
Bell (uma atuação distinta de Gyllenhall, rica em equivalências contrapostas a
sutilezas diferenciadas) um ator, casado, cuja esposa Helen (a bela e fria
Sarah Gadon, de inúmeros filmes da fase recente de David Cronenberg) se encontra
grávida de seis meses.
Eles não apenas são parecidos, são praticamente
duplicatas um do outro, e a descoberta desse detalhe leva ambos a um jogo perturbador
de troca de identidades: Adam, na frustração vilipendiosa de sua incapacidade
em ascender como ator, quer uma chance de transar com Mary, e disso extrair
algo que o faça sentir-se menos medíocre.
Já, Anthonie, na seqüência da reação absolutamente
passiva que tem ao plano de seu duplo, vê nessa oportunidade uma chance de
aproximação de Helen, em um momento cheio de tensão e expectativa; ela não é
tão ingênua quanto se presume, e tem conhecimento deles serem duplicatas.
Não obstante esse fervilhante conto de dúbio
significado moral –e a maneira intrigante e inquietante com que Villeneuve o
narra –há, no filme, uma pontuação de cenas, desde o início, que entregam
indícios que podem estar fora da cronologia (ou em sonhos) e que mostram cenas que
remetem à seres aracnídeos (sempre eles relacionados à personagem de Sarah).
Tais cenas culminam na imagem final, um instante tão absurdamente surreal que
chega a provocar uma ligeira interjeição de surpresa no expectador –para
descobrir, no instante seguinte, que o diretor acabou o filme ali e aquela é,
portanto, sua cena final.
Villeneuve adapta a obra de José Saramago
preservando suas características desafiadoras (até mesmo acrescentando algumas
camadas novas) e embutindo em sua narrativa observações alegóricas carregadas
de significado que, após esse enigmático final, podem oferecer alguma
elucidação para a misteriosa forma com a qual se encerra.
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