O filme de Clint Eastwood surgiu discretamente,
aparentando de arrancada uma semelhança bastante grande com “Girlfight”, um
trabalho independente da diretora Karyn Kusama, estrelado por Michelle
Rodriguez (de “Velozes e Furiosos”) e lançado alguns anos antes.
Entretanto, “Menina de Ouro” foi pouco a pouco
arregimentando admiradores que enfatizavam a guinada brusca, dramática e
magnífica que a trama sofria em seu terceiro ato e que só aprofundava os
relacionamentos e as questões íntimas já muito bem construídas pelo roteiro
austero e objetivo de Paul Hagis e pela direção de Eastwood. E ainda lançava o
filme numa outra reflexão completamente diferente e inesperada.
Quando o filme começa, Eastwood lança seu olhar
–carregado de empatia e de parcimônia para com os pormenores mais simples
–sobre a vida de Maggie (Hillary Swank, vencedora do Oscar de Melhor Atriz),
uma garota pobre, porém determinada a freqüentar uma academia de boxe e, se
possível, fazer sucesso como uma lutadora campeã.
Para tanto, ela insiste na tentativa de ser
treinada pelo dono do lugar, Frankie Dunn (Clint Eastwood), uma espécie de
descobridor de talentos do pugilismo. Mas, Frankie não vê futuro numa moça com
talento para o boxe –um esporte predominantemente masculino –e o pouco de
receptividade que Maggie consegue vem de Eddie ‘Scrap’ Dupris (Morgan Freeman,
que ganhou aqui seu único Oscar até então, de Melhor Ator Coadjuvante), o
zelador do ginásio que tem com Frankie uma relação de implicante convivência
típica dos homens de idade avançada que nutrem profunda ligação afetiva.
O filme de Eastwood até aí se constrói com
solidez como um drama bem conduzido, prazeroso e envolvente sobre personagens
comuns unidos por compatibilidade e por um amor de natureza mundana, sem
arroubos sentimentais, mas nem por isso menos belo.
Todavia, há um crescendo notável na narrativa
quando, após muita perseverança, Frankie cede em treinar Maggie, e ela
rapidamente se destaca nos ringues chegando a disputar o título de campeã de
pesos-médios. Soa quase como uma sacada de gênio, quando uma fatalidade
inesperada muda o rumo das coisas e dá um novo enfoque ao relacionamento dos
dois e conduz a trama de Frankie e Maggie num gênero completamente diverso.
“Menina de Ouro” acaba
sendo não apenas um tributo e um testemunho à maturidade de Clint Eastwood como
cineasta, mas também uma obra singular que leva o espectador por meio da
subversão de suas próprias expectativas, a uma profunda discussão sobre a
eutanásia, num trabalho tão ou até mais contundente do que o ótimo filme
espanhol “Mar Adentro”, lançado naquele mesmo ano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário