segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Fogo Sagrado

Em “Holly Smoke”, tanto diretora como atriz pareciam trabalhar sob a luz de uma certa necessidade de se provar: Jane Campion havia ganhado, anos antes, a Palma de Ouro em Cannes pelo premiado “O Piano” enquanto Kate Winslet vinha do fenômeno “Titanic”.
Talvez, tenha sido essa pressão que torna meio pedante a narrativa desde promissor trabalho, onde Campion lança um curioso olhar –repleto de exotismo e despojamento feminino –às intrincadas emoções que norteiam a devoção passional, e o quanto o pouco entendimento dos jovens pode se submeter ao cinismo dos mais velhos, ainda que a manipulação seja uma via de dois lados.
O começo –infinitamente mais instigante do que o restante de filme que se segue após ele –acompanha a jovem Ruth Barron (Kate, mostrando-se a atriz perspicaz, linda e atraente que pudemos ver no filme de James Cameron) numa viagem à Índia, onde ela se deixa fascinar pelas doutrinas religiosas e tão distintas das ocidentais que encontra por lá.
Ao voltar para casa, sua família se vê aflita com a ‘lavagem cerebral’ feita nela e, em desespero, contrata os serviços de PJ Waters (Harvey Keitel, repetindo com Campion a parceria de “O Piano”) um homem de meia-idade especializado em "desprogramação religiosa".
PJ isola-se com ela em uma casa de campo. O intuito é o de aproveitar a privacidade e a ausência de interrupções cotidianas proporcionada pela distância para eliminar a influência cega e fanática a qual ela parece ter sido exposta.
Campion lança mão de uma louvável habilidade para construir diálogos de ordem reflexiva a partir desse ponto, fazendo seu filme soar, no entanto, mais como uma vitrine para seu talento do que como uma obra feita com inspiração.
Não ajuda muito a guinada formulaica e maniqueísta que o filme sofre pouco antes da sua metade quando, em função desse isolamento, a fragilidade da jovem vai dando lugar a uma necessidade física carnal e a uma atração pelo "desprogramador" que termina por seduzir o homem mais velho.
Embora Campion entregue cenas um tanto quanto ousadas da parte de sua protagonista (Kate Winslet sempre foi um das poucas atrizes aclamadas que nunca temeu ousar em cenas de nudez) é a partir desse ponto que “Fogo Sagrado” se torna um filme confuso e perdido, adquirindo aspectos cada vez mais equivocados conforme a história se afasta da proposta que aparentava ter no inicio, e ruma em direção a uma oscilante e não muito convincente história de amor.
Nota-se que, nas cenas de sexo bastante despojadas que constrói, Campion mira no escandaloso, numa espécie de transgressão por meio da arte e do questionamento, mas acerta mesmo no constrangedor, no taxativo equívoco em conciliar duas partes que, neste filme, nunca se harmonizam: A discussão sobre o direito alheio de determinar os dogmas religiosos dos mais jovens, e o sexo como moeda de troca pelo exercício existencial de poder.

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