quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

O Quê É Isso, Companheiro?

A indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro para “O Quatrilho”, de Fabio Barreto, em 1996, foi uma espécie de reconhecimento aos esforços da fase da Retomada do cinema brasileiro –era apenas isso, uma indicação, não restando dúvidas de que os demais indicados eram superiores e tinham muito mais chance de ganhar.
Já, em 1998, com “O Quê É Isso, Companheiro?”, de Bruno Barreto (irmão de Fabio), as chances eram um pouco maiores.
Não levou do mesmo jeito.
No entanto, “O Quê É Isso, Companheiro?” representa nitidamente um salto de qualidade e sofisticação na forma de fazer cinema que os realizadores brasileiros estavam redescobrindo.
É curioso como, ao analisar o filme, inclusive levando em conta suas muitas qualidades, ficam evidentes as segundas intenções do diretor em relação ao prêmio e à visibilidade que ele almejava dentro e fora do país.
Veterano na área, inclusive com uma das maiores bilheterias do cinema nacional, “Dona Flor e Seus Dois Maridos”, no currículo, Bruno Barreto realizou uma obra com nítidas pretensões de soar inteligível e acessível aos expectadores de outro país, não somente o Brasil –diferente do modesto “O Quatrilho”, com sutilezas culturais e regionais que provavelmente só se compreendiam aqui (ainda mais especificamente na região sul) –reconstituindo os eventos que envolveram o seqüestro, em terras brasileiras, de um embaixador americano (vivido por Alan Arkin, com o brilho de sempre).
Ambientado nos anos 1960 e, portanto, historicamente relevante no retrato da luta armada contra a ditadura que promovia (um assunto pouco aproveitado pela filmografia brasileira), o filme lança um olhar algo maniqueísta sobre os militantes ativos responsáveis pelo seqüestro, Fernando (Pedro Cardoso), Maria (Fernanda Torres), Marcão (Luis Fernando Guimarães), René (Claudia Abreu), Jonas (Matheus Nachtergale, ótimo) e Júlio (Caio Junqueira), mostrados com hesitante humanidade, ampla condescendência e subliminar simpatia, enquanto que se vale de uma inapropriada ironia ao mostrar os agentes do governo, interpretados por Marco Ricca e Maurício Gonçalves –particularmente artificial é a cena onde torturam um prisioneiro enquanto dialogam sobre futilidades domésticas, nela as fraquezas da direção de Bruno Barreto ficam mais nítidas.
Seu registro unilateral dos percalços da História recente do Brasil só não é mais contundente que sua inclinação para satisfazer o ponto de vista norte-americano: Coadjuvante indiscutível do filme, o político seqüestrado de Alan Arkin é tratado nos breves diálogos que possui como o personagem mais austero e sensato do filme, soando ideologicamente superior ao personagem de Cardoso, com quem ele mais interage.
Não obstante esse elaborado plano para cair nas graças da Academia de Artes Cinematográficas, a narrativa elegante de Bruno Barreto emula com precisão os elementos do diretor Costa Gravas (um mestre no que diz respeito a suspenses de natureza política) em sua busca paulatina por algo a denunciar e em seus astutos empregos de ferramentas de ficção e de dramaturgia para equilibrar o aspecto historicamente relevante com a funcionalidade enquanto obra de cinema.
Não funciona como um relógio, e a insistência de Barreto em fazer concessões engessa o ritmo em muitos momentos, mas foi um passo considerável no caminho para um cinema cada vez mais qualitativo feito no Brasil.

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