sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Onde Vivem Os Monstros

Embora em sua aparência “Onde Vivem Os Monstros” dê a impressão de ser destinado às crianças, o diretor Spike Jonze moldou na verdade um filme profundamente poético e sombrio sobre os inescapáveis detalhes lúgubres da infância.
Essa percepção já surge imediatamente quando acompanhamos a melancólica rotina do jovem Max (o pequeno e notável Max Records), de oito anos, um garotinho que por vezes se ressente de sua condição de criança incapaz e ignorada, na casa, onde mora com a irmã mais velha e a mãe divorciada e atarefada (Catherine Keener, meio que revelada pelo próprio Spike Jonze em “Quero Ser John Malkovich).
Como toda criança carente de atenção, Max se enfeza e se entristece por motivos que, aos olhos desavisados, parecem birra de criança. Após um desentendimento com a mãe, ele ensaia uma fuga, noite adentro ainda trajando a roupa de lobo que tanto gosta. O filme de Jonze assume então um ar lúdico que deixa indistinguível o que pode ser um sonho do que pode ser realidade –um dos detalhes fascinantes do filme –e vemos Max tomar um barco e, rumar oceano afora. Ele chega então numa ilha habitada por monstros grandalhões e falantes, que, de início querem devorá-lo –e que nada mais são senão reflexos de pulsões emocionais do próprio Max (o menino, portanto, na iminência de ser devorado pelas próprias emoções às quais não tem controle).
Contudo, os monstros ostentam uma ingenuidade e uma inocência em contrapondo à crueldade e ferocidade que desejam expressar, e talvez por conta disso, Max os sobrepuja com a promessa de que é um rei e que sua presença lhes trará felicidade. Assim, na condição de "rei dos monstros", Max fica seus dias junto deles onde partilha de suas inseguranças e peculiaridades muito humanas.
Os monstros brigam, discordam, questionam uns aos outros, às vezes, com uma imaturidade que simula as próprias relações humanas.
Por um tempo, aquela convivência supre, para Max, as experiências que ele tinha em casa –não mais negligenciado, ou subestimado, ou deixado de lado, ele se satisfaz com o fato de possuir um papel de relevância entre aquelas criaturas. Mas, como o diretor Jonze trata de avaliar em todos os seus filmes, as dinâmicas sempre sofrem, acima de tudo, com a saturação proporcionada pelo passar do tempo: Como o computador de “Ela”, como os gêmeos vividos por Nicolas Cage em “Adaptação” e como o homem no corpo de John Malkovich em “Quero Ser John Malkovich”, o pequeno Max percebe, quando a situação ganha os contornos do tédio e da rotina, que a condição que vive é, em última instância, insatisfatória em relação à vida que tinha. E então decide partir, deixando para trás uma ilha de monstros implorando para que fique.
Certamente, a concepção do pouco usual Spike Jonze para uma fantasia infantil é desafiadora para as convenções, soando melancólica a reflexiva em excesso. É algo até natural, portanto, que esta produção incomum e profundamente pessoal não tenha encontrado seu público.

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