terça-feira, 3 de abril de 2018

A Promessa

Dentre os renomados cineastas chineses, aplaudidos por todo o mundo por suas obras dramáticas, Chen Kaige, o célebre realizador de "Adeus Minha Concubina", sempre foi o mais desigual. Nada mais natural que –a exemplo de Ang Lee (“O Tigre e O Dragão”) e Zhang Ymou (“O Clã das Adagas Voadoras”) –sua incursão nos filmes de artes marciais fosse, também ela, de um resultado todo singular e incomum.
Num mundo pleno de fantasia, um reino fragmentado entre o Mar do Céu e a Terra da Neve enfrenta uma guerra sangrenta na disputa mesquinha por sua coroa. Procurando por comida no campo de batalha (todo ele registrado numa opção visual rica em artesanato e artificialismo da parte de seu designer de produção), uma menina pobre, Qingcheng, foge com um bolinho nas mãos que, ao cair nas águas de um rio, revela a ela a presença da deusa Manshen que a oferece uma alternativa à vida miserável: Crescer para tornar-se dona de uma beleza hipnótica e por meio dela desfrutar de riqueza e bem estar, exceto pelo fato de que pagará um alto preço por isso, pois todo o homem que ela amar morrerá.
Vinte anos depois, as guerras ainda persistem, e o humilde escravo Kunlun (Jang Dong-Gun) –tão humilde que sequer tinha o hábito de andar em pé, só ajoelhado ou rastejando –acaba sem querer promovendo uma inversão no conflito, favorecendo o Exército da Armadura Vermelha, liderado pelo Grande General Guangming (Hiroyuki Sanada, que não é chinês, mas japonês), perante o Exército Negro.
Nomeado escravo de Guangming, Kunlun o acompanha numa missão de suma importância: Ir à Cidade Imperial, onde o rei se vê encurralado por seu maior inimigo que lhe deseja tomar a esposa, que não é nenhuma outra senão Qingcheng, agora crescida (e interpretada pela belíssima Cecília Cheung).
No percurso, Guangming é ferido e, sem condições de prosseguir, ordena a Kunlun que vista sua armadura e, passando-se por ele, que conclua sua missão; eis que então o pobre escravo será confundido com o grande herói de guerra pelas circunstâncias. Tomado como Guangming, Kunlun salva a princesa Qingcheng e mata o rei (por pura imprudência e ignorância) e, quando a culpa ameaça recair sobre Guangming, a deusa Manshen reaparece que faz com ele uma aposta: Obter a soberania e o amor de Qingcheng.
Intrincado, não? Fica ainda mais: Acontece que Qingcheng se afeiçoou ao homem de armadura que a salvou (que ela presumiu ser Guangming, mas que era Kunlun), e ao ser resgata de uma prisão por Kunlun onde seu novo pretendente Wuhuan a colocou, deixa o escravo para trás –preso pelos inimigos –para fugir junto com Guangming.
No entanto, Qingcheng por algum tempo tenta abandonar Guanming (ela sabe que se continuar com ele a maldição se fará presente e ele morrerá), enquanto Kunlun é salvo por um estranho e sombrio assassino de aluguel que, compadecido dele, lhe revela seu passado nobre na lendária Terra da Neve –de onde provêem suas habilidades prodigiosas.
A família que Kunlun antes teve (ele descobre durante uma viagem no tempo!) foi chacinada por Wuhuan –deveras, o grande vilão do filme –enquanto o amor entre Guangming e Qingcheng evolui a medida que o próprio Guangming compreende que Qingcheng se apaixonou por Kunlun quando este vestiu sua armadura e não por ele.
Será o próprio Wuhuan, após muitas vicissitudes dessa espécie de triangulo amoroso, quem irá conduzir essa situação a um desfecho quando capturar Guangming, para ser julgado pelo assassinato do rei, e depois Qingcheng obrigando Kunlun a intervir em definitivo.
Um bom exemplo da criatividade visual do diretor Chen Kaige, esta bela superprodução chinesa, pródiga em cenas de ação "wuxia", como é designado no oriente o gênero das artes marciais que desafiam a gravidade com vôos impossíveis, trás mais do que apenas vôos impossíveis: Ela habita todo um universo cinematográfico de improbabilidades físicas, onde os homens demonstram rapidez e leveza que os tornam seres sobrenaturais –e tais elementos coexistem na trama junto da própria natureza. Tudo isso e mais o esforço de Chen Kaige em emoldurar esta fantasia romântica com seu apurado e contundente senso de fatalismo passional presente em todos os seus trabalhos faz de “A Promessa” uma experiência sensorial plena.

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