Entre outros méritos indiscutíveis, o cinema sul-coreano possui uma cena clássica
que parecia inigualável: A luta espetacular em um corredor entre o protagonista
e dezenas de bandidos, de “Old Boy”.
Tão engenhosa e antológica ela é que sequer a
refilmagem americana (dirigida por Spike Lee) foi capaz de equiparar tal cena.
Sem intenção de se acomodar, coube ao próprio
cinema sul-coreano a tarefa de superar seu próprio feito: Este “A Vilã” tem,
também ele, a cena de uma luta num corredor (pelo menos, é como ela começa),
que ostenta ainda mais virtuosismo, genialidade e audácia do que a cena
clássica de “Old Boy” –e ela, ainda por cima, é só a cena que abre o filme!
Consciente do poder avassalador dessa sequência
inicial, todo o filme é disposto como um novela de lã que desemparassa-se a
partir exclusivamente desse estrarrecedor momento.
Por meio de flashbacks fora da linearidade –os quais
cabe ao expectador aos poucos decifrar a ordem –a trama acompanha Sook-Hee (a
bela Kim Ok-Bin), autora da inacreditável proeza física do início; quando
promove uma chacina em um grupo criminoso que parece se multiplicar a medida
que ela deflagra cada vez mais mortes.
Capturada, ela vai parar nas mãos de uma
organização que treina assassinas de elite –e, com isso, aprimora ainda mais
suas mortais aptidões.
A apaixonada referência à “Nikita”, de Luc
Besson, não é casual –e há um momento em que esse filme é lembrado no resgate
de sua beleza estética
Intercalados por esse treinamento, algumas
cenas vão mostrando as razões que a levaram àquele extremo; e que pouco a pouco
respondem porque ela estava grávida (!), e o quê a levou, nas décadas que se
seguiram, a procurar pelo misterioso assassino de seu pai.
Com sua filha já contando cerca de cinco anos,
Sook-Hee passa a viver a fachada de uma vida normal seguindo a carreira de
atriz (vigiada de perto por outro agente da organização que acaba se
apaixonando por ela) –mas, isso tudo é um disfarce para a atividade de
assassina que ela terá de ocasionalmente exercer: É justamente num desses
momentos que uma grande surpresa vai promover uma reviravolta na sua vida, e no
filme.
Intrincado, eletrizante e difícil de ser
colocado em palavras por seu elaborado primor narrativo e pela sua trama
magistral pontuada de surpresas, “A Vilã” é um exercício sem igual de
desenvoltura técnica: O diretor Jung Byung-Gil, na tradição dos magníficos e
ousados realizadores sul-coreanos, constrói cenas sensacionais feitas para
ficarem cravadas na memória do expectador.
Existem muitas para se enumerar, mas há que se
citar a cena final, um salto técnico e artístico além do que parecia
insuperável (a cena inicial), onde ele acompanha, por meio de um plano-sequência
frenético e implacável (feito para aparentar não ter cortes, mas certamente
repleto de emendas digitais invisíveis) a busca inacreditável de Sook-Hee por
sua vingança. É uma cena crua, violenta, sangrenta, extensa e magistral cuja
perícia deve demorar uns bons anos até ser superada –se é que o será!
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